Luís Graça & Camaradas |
Subsídios para a história da guerra colonial > Guiné (8) > Outras Zonas > Cacheu > Barro, Binta, Bigene,Guidage
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Guiné > Região de Cacheu > Barro
Guiné > Cacheu > Localização de Barro
"Barro fica a cerca de 3 kms da fronteira com o Senegal. Na altura em que lá estive, com a CCAÇ 3, [em 1968], o comandante era o capitão Carlos Abreu (depois do 25 de Abril foi adjunto do General Spnola). A missão da CCAÇ 3 em Barro (em Binta, não sei) era evitar a passagem dos guerrilheiros do PAIGC e das populações por ele controladas do Senegal para a mata do Óio. A missão deles era, sobretudo, fazer abastecimentos em géneros e em material bélico para os combatentes daquela zona. A nossa era evitar que isso sucedesse. Essas infiltrações vinham, nomeadamente, das tabancas Sano, Sonako e Samine, situadas no Senegal.
"Além das emboscadas que montávamos, muitas armadilhas foram colocadas naquela zona para obviar a isso (quando ouvíamos bum!, íamos a correr pois devia ser uma vaca que caiu na armadilha)". |
O nosso álbum de fotografias >
Bambadinca > CCAÇ 2590 / CCAÇ 12 (1969/1971)
Bambadinca > BCAC 2852 (1968/1970) / BART 2917 (1970/1972) /BART 3873 (1972/1974)
Banjara / Geba > CART 1690 (1967/68)
Barro / Cacheu > CCAÇ 3 (1968)
Cansissé / Nova Lamego (Gabu) > 3ª CART / BART 6523 (1973/74)
Cantacunda / Geba > CART 1690 (1967/68)
Contuboel > CCAÇ 2590 / CCAÇ 12
Mansambo > CART 2339 (1968/1969), CART 2714 (1970/72), CART 3493 (1972/1974)
Nova Lamego (Gabu) > BART 6523 (1973/74)
Xime > CART 2520 (1968/70), CART 2715 (1970/72), CART 3494 (1972/1974)
Xitole > CART 2413 (1968/70), CART 2716 (1970/1972)
(a) Um especial agradecimento ao A. Marques Lopes, ao Américo Marques,ao David J. Guimarães, ao Humberto Reis e ao Sousa de Castro que têm alimentado o nosso álbum de fotografias e ajudado a rejuvenescer a nossa memória
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > A fotografia aérea da região do CXacheu
"Uma vez ou outra aproveitei a vinda da Dornier com os frescos e pedi ao piloto para dar uma volta. Foi um elemento importante para conseguir descobrir os trilhos utilizados nas infiltrações e as passagens no rio Cacheu. Quanto à vista aérea do quartel ainda deu bronca. Quiseram-me confiscar a fotografia, pois podia ser um factor de informação para o IN... a juntar às 24 horas passadas no campo do inimigo. Tá visto que eu estava feito com o IN, se calhar alguém pensou".
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro (1968) > Vista aérea do quartel
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Aspectos da povoação de Barro
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968 > Secretaria e Comando
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968 > Paiol e refeitório
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968 > Siostema de defesa da povoação
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968 > O grupo de combate do Alferes Lopes
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968: O alferes miliciano Lopes com elementos, balantas, no seu grupo de combate.
"Eles consideravam-se os jagudis, consideravam-se um grupo especial".
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968: Uma terra de bolanhas, lalas e rios...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Cacheu > Barro (1968) > Os "jagudis" montando uma emboscada
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro (1968) > Cenas da vida de um operacional
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné > Cacheu > CCAÇ 3 > Barro (1968) > Uma pausa, no mato, para retemperar as forças
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné > Cacheu > CCAÇ 3 > Barro (1968) > O Alferes Lopes, coberto de pó, de regresso, ao quartel
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Cacheu > Barro (1968) > O abastecimento das NT era feito através do Rio Cacheu, sob +protecção dos fuzileiros.
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Cacheu > Barro (1968) > O correio e os "frescos", de Bissau, também vinha por avioneta...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro (1968) > O alferes miliciano Lopes desmontando uma mina. Em Geba, um ano antes, tinha sido atingido pela explosão de um destes engenhos...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Cacheu > Barro (1968) > Bazuca 8.9 e metralhadora pesada Breda
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Cacheu > Barro > O espaldão do mortreiro 80
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Cacheu > Barro (1968) O ex-alferes miliciano Lopes , com o seu o seu grupo de combate de balantas, os "jagudis", depois de uma incursão no vizinho Senegal
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné > Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968> O resultado de uma ida a Sano, no Senegal...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > O ex-alferes miliciano Lopes da CCAÇ 3 (Barro, 1968) , com o seu guarda-costa, balanta
"O meu guarda-costas chamava-se Bletche-Intete. Grande amigo. Um dia deu-me um grande empurrão durante um tiroteio... é que eu tinha-me virado de costas para o local de onde o IN estava a disparar (fiquei mal dos ouvidos desde que fui ferido em Geba)".
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Cacheu > Barro (1968) > A morte e a inumação do corpo de um guerrilheiro no próprio local, com um mínimo de dignidade humana
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro: Os encontros e os desencontros da guerra...
O meco aqui visto era bom rapaz. E foi bom rapaz, quando me apanhou na Feira Popular de Lisboa a distribuir propaganda contra a guerra colonial em 1973. Não me bateu, levou-me para a esquadra do Campo Grande, mas saí de lá sem identificação nem nada. A amizade continua".
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné >Cacheu > CCAÇ 3 > Barro > 1968> Um prisioneiro do PAIGC
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné > Cacheu > CCAÇ 3 > Barro (1968) > Os putos...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné > Cacheu > CCAÇ 3 > Barro (1968) > As bajudas...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné-Bissau > Cacheu > Barro (1968 > Feliz Natal...
"Este é mais outro aerograma que descobri. Mandei-o, pelo Natal, em 1968. O que eu quis transmitir é que eram natais de morte e que o que procurava era esquecer, dando de beber à dor".
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné-Bissau > Cacheu > Barro (1998) > Atravessando o Cacheu, de regresso ao passado...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné-Bissau >Cacheu > Barro (1998) > Reeencontro do tuga A. Marques Lopes com Cacuto Seidi, chefe da tabanca de Barro
"O Cacuto Seidi era o chefe da tabanca de Barro em 1968. Muitas vezes fui até à sua porta para falar com ele. Por duas razões: a primeira é que suspeitávamos que ele estava feito com o PAIGC (...).
"Em 1998 fui a Barro. Assim que me viu abriu a boca e disse admirado:
-Alfero Lopes!-
"Ao fim de 30 anos lembrou-se logo de mim, apesar de estarmos os dois mais velhos, de tal modo que quem me acompanhava ficou com a boca aberta de espanto. É que foi, de facto, muito tempo de convívio e de conversa.
"Perguntei-lhe pelo Braima, um caçador da tabanca de Barro, muito conhecedor de toda aquela zona e que foi o meu guia em 1968, porque conhecia todos os trilhos e buracos quer na mata quer no tarrafe das margens do Cacheu. O Cacuto ficou atrapalhado e respondeu:
- O Braima mataram. - Ah! - disse-lhe eu - mas tu continuas a ser o chefe da tabanca! Então, eu tinha razão... -. Acabou por se rir, é claro".
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné-Bissau >Cacheu > Barro (1998): Restos de uma granada do PAIGC, detonada...
© A. Marques Lopes (2005)
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Guiné > Cacheu > CART 2412 > Bigene, Binta, Guidage, Barro (1968/70) > O Afonso Sousa vem trazer para nossa tertúlia o tema dos "nossos rádios na Guiné". Teve, além disso, a gentileza de nos mandar imagens desses equipamentos de cuja existência e importância só dávamos conta em momentos de grande aflição: (i) quando, no mato, debaixo de fogo do IN, chamávamos pela mãezinha e pelo apoio da Força Aérea; ou (ii) quando tínhamos um camarada gravemente ferido, e era preciso uma evacuação Y para o hospital militar de Bissau... vd. post de 2 de Julho de 2005, no nosso blogue (Guiné 69/71 - XCIV: Um alfa bravo para os nossos Op TRMS) ...
Legenda (da esquerda para a dierita, e de cima para baixo): (i) Rádio AN-GRC-9; (ii) Rádio AN-GRC-9 (esquema); (iii) Rádio AN-PRC-10; (iv) o Banana AVP-1
© Afonso Sousa (2005)
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Guiné > Cacheu > Localização da Zona de Intervenção da CART 2412 (Agosto de 1968/Maio de 1970): Barro, Bigene, Binta, Guidage. A sul de Guidage, o aquartelamento localizado mesmo na fronteira, ficava Binta e, mais a sudeste, Farim. Abaixo de Binta, ficava Olossato, e abaixo de Farim, Mansaá. Todos estes nomes são míticos, para os muitos soldados portugueses que passaram pela região do Cacheu e do Morés.
"Zona tampão entre o Rio Cacheu e alinha de fronteira com o Senegal (corredores de Tanafe e Samine). Zona de importância estratégica para o PAIGC - entre o Rio Casamance (Senegal) e as densas matas do Óio (Guiné), onde se localizava a sua importante base de Morés . Spínola ordenou o estabelecimento da Base Fluvial de Ganturé (Bigene) em 1969 para intenso patrulhamento do Rio Cacheu e colaboração com as forças terrestres. Estacionámos lá, à espera de LDG, vimdpos de Barro rumo a Bissau no final da missão. Esta base de fuzileiros navais estava estava sob o coamndo do aguerrido Alpoím Galvão, um dos magníficos de Spínola
© Afonso Sousa (2005)
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Créditos fotográficos
© A. Marques Lopes > Fotos e outras imagens gentilmente cedidas por A. Marques Lopes, coronel (DFA) na situação de reforma, ex-alferes miliciano da CART 1690 (Geba, 1967) e da CCAÇ 3 (Barro, 1968) |
© Afonso Sousa > Fotos e outras imagens gentilmente cedidas por Afonso M.F. Sousa, ex-furriel miliciano de transmissões da CART 2412 ( Bigene, Binta, Guidage, Barro ) (1968/70) www.ensp.unl.pt O Colonialismo Português na Guiné:Os crimes de uma Guerra perdida
«Desde o tempo das chamadas descobertas ou achamentos até ao tempo do comércio de escravos e crimes da escravatura; desde as guerras de conquista colonial até à época de ouro do colonialismo; das primeiras “reformas” ultramarinas até às guerras coloniais de genocídio dos nossos dias, os colonialistas portugueses deram sempre provas de uma mentalidade supersticiosa e dum racismo primitivo em relação ao homem africano, que consideravam e consideram como naturalmente inferior, incapaz de organizar a sua vida e defender os seus interesses, fácil de enganar, sem cultura e sem civilização».
Amílcar Cabral, 1971
Ao longo da guerra de libertação nacional, o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e o seu líder, Amílcar Cabral, denunciaram repetidas vezes – em declarações públicas, em mensagens, em relatórios, em comunicados de imprensa, em documentos apresentados à Organização das Nações Unidas e à Organização da Unidade Africana – aquilo que consideravam ser crimes cometidos pelos colonialistas portugueses na Guiné. E não se limitaram a denunciar, apresentaram provas: recolheram declarações de vítimas de torturas e ferimentos, mostraram fragmentos de bombas «napalm», promoveram testemunhos de jornalistas, cineastas, escritores, delegações de organizações e países e outros observadores insuspeitos. Com base na leitura de documentos publicados pelo PAIGC, sobretudo intervenções de Amílcar Cabral, para o caso da Guiné, são inúmeros os exemplos desses crimes atribuídos ao colonialismo português.
«O “apartheid” à portuguesa» – Em Junho de 1960, numa brochura publicada em Londres, intitulada «The facts about Portugal’s african colonies», com prefácio do jornalista e historiador Basil Davidson, Abel Djassi, pseudónimo de Amílcar Cabral, explicava à opinião pública europeia a situação dos 11 milhões de africanos submetidos à dominação colonial portuguesa. Afirmava que apesar das riquezas naturais existentes em Angola, Moçambique, Guiné, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, «os africanos têm um nível de vida inferior ao mínimo vital» e «a sua situação é de servos no seu próprio país». Lembrava que depois do tráfico de escravos, a conquista pelas armas e as guerras coloniais «de pacificação», veio a destruição completa das estruturas económicas e sociais da sociedade africana. Seguiu-se a fase de ocupação europeia e o povoamento crescente, a partir de finais do século XIX e, no caso da Guiné, até 1936, quando terminaram as guerras de «pacificação»: as terras e os haveres dos africanos foram pilhados, os portugueses impuseram a «taxa de soberania» e tornaram obrigatória a cultura de certos géneros (na Guiné, através da Companhia União Fabril (CUF), foi imposta a cultura da mancarra); instituíram o trabalho forçado e organizaram a deportação de trabalhadores, os «contratados».
Denunciando a ideologia racista do estatuto indígena – imposto no início da década de 30 do século XX por Salazar e só formalmente abolido em 1961, por Adriano Moreira, então ministro do Ultramar do regime fascista – Cabral ridicularizava «a ideia de criar uma “sociedade multirracial” nas colónias, baseada legalmente no estatuto indígena», «na realidade o “apartheid” à portuguesa». E comentava: «99,7% da população africana de Angola, Guiné e Moçambique é considerada “não civilizada” pelas leis coloniais portuguesas e 0,3% é considerada assimilada. Para que uma pessoa “não civilizada” obtenha o estatuto de “assimilada”, tem de fazer prova de estabilidade económica e gozar de um nível de vida mais elevado do que a maior parte da população de Portugal. Tem de viver à “europeia”, pagar impostos, cumprir o serviço militar e saber ler e escrever correctamente o português. Se os portugueses tivessem de preencher estas condições, mais de 50% da população não teria direito ao estatuto de “civilizado” ou de “assimilado”».
Onda de repressão e terror – Nesse ano de 1960, já em Conakry, na República da Guiné – onde instalou o secretariado-geral do PAIGC e obteve apoios do Partido Democrático da Guiné (PDG) e do presidente Sékou Touré –, Amílcar Cabral enviou, em panfletos, mensagens aos funcionários públicos e empregados comerciais guineenses e cabo-verdianos, aos militares guineenses e cabo-verdianos (oficiais sargentos e soldados obrigados a servir no exército colonial português), aos jovens da Guiné e Cabo Verde e até aos colonos portugueses nos dois territórios, convidando-os a juntarem-se à luta de libertação nacional, denunciando os colonialistas que «perseguem, prendem, torturam, massacram, reforçam cada vez mais as suas forças armadas e preparam-se cinicamente para continuar a afogar em sangue todas as tentativas de libertação por parte dos nossos povos».
Texto de Carlos Lopes Pereira para o III Encontro Civilização ou Barbárie.
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sarrabulhada.blogspot.pt
A questão mais incómoda da guerra colonial
Dalila Mateus, num livro editado há tempos atrás mas que é uma referência da historiografia dedicada à guerra colonial (*), portanto sempre actual, aborda as actividades da Pide/DGS nas antigas colónias no período 1961-1974, uma questão que ainda é tabu, até pelos desassossegos que desperta em grande parte dos militares que participaram naquela guerra. A historiadora expõe os mecanismos de actuação da Pide/DGS em África e os meios que dispunha e que utilizava (na medida do que é possível saber-se e escapou à destruição dos arquivos). Além de demonstrar que o que se passou nas frentes das guerras coloniais foi um genocídio intermitente gerido contra as populações africanas (confirmando a caracterização feita pela ONU), para além de actos de brutalidade generalizada e de máxima crueldade praticados pelas Forças Armadas, sobretudo durante o primeiro período da guerra mas que se verificaram pontualmente até ao fim, o grosso das acções de obtenção de informação, infiltrações entre os guerrilheiros, atentados contra os seus líderes, tortura de prisioneiros, gestão de prisões e de campos de concentração (onde o internamento era ordenado pela própria Pide, sem julgamento e como sendo um ”acto administrativo”de “fixação de residência”) foram cometidas à Pide/DGS. Ou seja, na maior parte dos casos, as Forças Armadas passavam para a Pide a maior parte do “trabalho sujo” relativamente a militantes, simpatizantes ou suspeitos de simpatias para com as causas nacionalistas.
Esta “repartição de tarefas” assentou numa cumplicidade e complementaridade totais e absolutas. Para além de permitir que as Forças Armadas salvaguardassem a sua imagem de “combatentes” apenas “guerreiros”, cumprindo uma qualquer ética castrense, e com margem para a chamada “psico”, o trabalho entregue à Pide “ganhou” em “especialização” e em “eficácia” (embora, por regra, as operações ofensivas tenham sido conjuntas). Mais, tornou as duas organizações numa espécie de irmãs siamesas em que uma não podia viver sem a outra. As operações militares faziam-se com base nas informações da Pide, a Pide trabalhava os prisioneiros feitos pelas Forças Armadas. Neste sentido, as torturas, os assassinatos, as prisões indiscriminadas, cometidas pela Pide durante a guerra colonial, foram crimes da polícia política mas mancharam, na mesma dimensão de iniquidade e responsabilidade, os comandos militares irmanados com a polícia. E sabendo como sabiam o que a Pide aplicava aos guerrilheiros, a co-responsabilidade é absoluta.
Como entender a resistência havida após o 25 de Abril, em extinguir a Pide em África, em que, sobretudo em Angola, ainda trabalharam durante muito tempo integrados na PIM (Polícia de Informação Militar)? Como entender a excelente apreciação que a maioria dos oficiais de carreira fazia sobre os méritos da Pide em África? Como entender que o Alto-Comissário em Moçambique (Vitor Crespo), onde a Pide foi desmantelada mais cedo, se tenha encarregado de destruir os ficheiros da Pide? Como perceber a ausência de escrúpulos dos militares golpistas após o 25 de Abril trabalharem em estreita colaboração com ex-pides, retomando velhas cumplicidades? Finalmente, como perceber que, enquanto na metrópole, a Pide era odiada pela população, em África ela era considerada e acarinhada pela maioria dos colonos (por vezes, mais estimada que os militares que faziam a guerra)? A resposta a estas últimas questões está, como hipótese, na noção que os militares profissionais tinham que não haveria condições para fazerem a guerra sem a Pide. E sabiam que a Pide “fazia bem” o papel que lhe estava atribuído (a maioria dos guerrilheiros reconhece isso, sendo uma das raras excepções a prosápia estúpida de Marcelino dos Santos da Frelimo que afirmou que a Pide não sabia nada). Compreende-se assim que, no início da pós-revolução, a Pide continuasse viva e bem viva nas ainda colónias. Ou pela integração no PIM, ou, clandestinamente, a ajudar a “resistência branca”, transbordando depois para o combate ao MPLA e, em Moçambique, na criação da Renamo.
Parte dos oficiais de carreira profissionalizados na guerra colonial (muitos deles com três comissões feitas) deram a “volta política”, participaram na descolonização e seguiram o paradigma político do MFA. Mas um número significativo de oficiais de média e alta patente (a partir de Major na altura do 25 de Abril) foi incapazes de digerir a descolonização e entender o papel da Pide como sendo um alicerce do regime (o que, sendo verdade, não abona sobre o regime). É que não foram as Forças Armadas (só por si) que fizeram as guerras nas colónias, a Pide (só por si) tão pouco. Foi uma e outra. Foi o regime salazarista-marcelista. Quando o regime caiu, o colonialismo caiu e a descolonização só podia ter como ponto de partida o ponto de chegada do colonialismo português. O “depois” “devia” ter sido diferente e melhor. Mas o “depois”” que houve partiu do “antes” herdado. Alguns militares da época não o entenderam na descolonização e cada vez o entendem menos, servindo a profusa literatura de memória e análise que publicam, em blogues e em livros, como demonstração dessa fixação, porque o ressentimento cresce com o tempo, sem que a catarse tenha sido feita. À força de “justificarem”, perante a sociedade e eles próprios, os anos de profissão naquelas guerras, perderam essa capacidade, a da catarse da participação de uma guerra injusta, impossível de vencer, iníqua nos meios utilizados e nos crimes cometidos, directamente ou com sua colaboração.
(*) – A Pide/DGS na Guerra Colonial – 1961-1974, Dalila Cabrita Mateus, Ed Terramar.
(Texto publicado também no blogue Água Lisa)
caminhosdamemoria.wordpress.com
A guerra colonial, os crimes de guerra e os retornados
Há quem, justamente, desaprove o apodo de “retornado ressentido” com que qualifico Passos Coelho e outros adversários implacáveis do Estado de direito e dos direitos sociais dos portugueses.
Entendamo-nos. Fui combatente na guerra colonial e não deixo de condenar os crimes cometidos por militares portugueses, varridos para debaixo do tapete. O culpado maior de todos os crimes foi o salazarismo, responsável por uma guerra injusta, criminosa e inútil, quando éramos tão atrasados que até a aceitar o direito dos povos à autodeterminação fomos os últimos.
Mas não podemos esquecer os massacres, perpetrados durante a guerra colonial, de que Wiriamu ficou como paradigma da violência gratuita e da crueldade assassina. Não nos julguem como se todos fôssemos o alferes Robles ou o comandante Alpoim Calvão que Cavaco continua a condecorar.
Não sou insensível aos dramas dos retornados, alguns familiares meus, entre os quais conto numerosos amigos e correligionários. Sinto orgulho na forma como Portugal acolheu as vítimas da independência das antigas colónias, rapidamente integrados e que muito contribuíram para o progresso do País.
Não sou xenófobo. Não me move o mais leve resquício de vingança contra quem julgou erradamente ser legítima a guerra que envolveu um milhão de jovens portugueses, onde morreram vários milhares e um número, incomparavelmente maior, ficou estropiado e ainda hoje lambe as feridas e suporta os traumas.
Tal como não esqueço os bombardeamentos sobre palhotas, onde arderam mulheres e crianças, também não esqueço os retornados que incendiaram sedes do PCP e do PS no país que também era seu e que tudo fazia para minorar a tragédia dos que regressaram, como não esqueço os terroristas que entusiasticamente aderiram ao ELP e ao MDLP.
Ser retornado, tal como ter sido militar na guerra colonial, não é crime, é uma desgraça comum. Crime é defender a legitimidade da guerra em que se participou ou vingar-se de ter sido vítima da descolonização. É este último defeito de Passos Coelho que execro e não deixarei de denunciar até o ver removido das funções que nominalmente exerce.
De uma vez por todas, aqui ficam a explicação e o contexto em que, na minha opinião, é justo designar como retornado ressentido, vingativo e incompetente o atual PM.
Entendamo-nos. Fui combatente na guerra colonial e não deixo de condenar os crimes cometidos por militares portugueses, varridos para debaixo do tapete. O culpado maior de todos os crimes foi o salazarismo, responsável por uma guerra injusta, criminosa e inútil, quando éramos tão atrasados que até a aceitar o direito dos povos à autodeterminação fomos os últimos.
Mas não podemos esquecer os massacres, perpetrados durante a guerra colonial, de que Wiriamu ficou como paradigma da violência gratuita e da crueldade assassina. Não nos julguem como se todos fôssemos o alferes Robles ou o comandante Alpoim Calvão que Cavaco continua a condecorar.
Não sou insensível aos dramas dos retornados, alguns familiares meus, entre os quais conto numerosos amigos e correligionários. Sinto orgulho na forma como Portugal acolheu as vítimas da independência das antigas colónias, rapidamente integrados e que muito contribuíram para o progresso do País.
Não sou xenófobo. Não me move o mais leve resquício de vingança contra quem julgou erradamente ser legítima a guerra que envolveu um milhão de jovens portugueses, onde morreram vários milhares e um número, incomparavelmente maior, ficou estropiado e ainda hoje lambe as feridas e suporta os traumas.
Tal como não esqueço os bombardeamentos sobre palhotas, onde arderam mulheres e crianças, também não esqueço os retornados que incendiaram sedes do PCP e do PS no país que também era seu e que tudo fazia para minorar a tragédia dos que regressaram, como não esqueço os terroristas que entusiasticamente aderiram ao ELP e ao MDLP.
Ser retornado, tal como ter sido militar na guerra colonial, não é crime, é uma desgraça comum. Crime é defender a legitimidade da guerra em que se participou ou vingar-se de ter sido vítima da descolonização. É este último defeito de Passos Coelho que execro e não deixarei de denunciar até o ver removido das funções que nominalmente exerce.
De uma vez por todas, aqui ficam a explicação e o contexto em que, na minha opinião, é justo designar como retornado ressentido, vingativo e incompetente o atual PM.
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