Cavaco Silva é o representante máximo da falência das instituições democráticas em Portugal. Não tenho particular gosto em exaustivamente repetí-lo. Tornou-se até cansativo, para mim, tentar perceber ao longo dos últimos anos o que promoveu este pequeno catedrático à ribalta. Ou melhor, a forma encapotada como se apresentou aos eleitores e vingou. Ainda assim, versa a minha análise sobre ele e os diferentes momentos históricos que liderou, a mal da Nação.
Comecemos pelo fim. Aníbal Cavaco Silva toma a decisão de insuflar o actual Governo. Em choque para com o seu dever, o de fazer cumprir os preceitos constitucionais, Cavaco inaugura o "Estado de Excepção" à porta fechada. Sem consulta prévia do seu conselho, cuspindo na vontade popular e na mediática declaração da inconstitucionalidade do Orçamento Geral do Estado, opta por segurar Pedro, Vítor e Paulo à cadeira, respectivamente. A justificação para este circo é curiosa: afirma a maioria parlamentar como suficiente para estabilizar o funcionamento do Estado. No momento seguinte, Pedro inteligentemente esvazia a autonomia das administrações públicas. Afinal, apenas controlam a Assembleia da República e o Estado, esse, parece estar contra eles. Aparentemente, Aníbal desconhece a esfera de legitimidade destes seus discípulos. Igual a si próprio, recusa-se a perder o seu tempo a informar os proles do teor desta decisão. Contudo, as palavras do Primeiro Ministro são elucidativas das razões do rapaz de Boliqueime: solidariedade. Conclui-se que Cavaco é parte integrante desta seita, assumindo hoje a sua liderança espiritual e política. Pessoalmente, escrutino esta decisão na esfera da Separação de Poderes e preocupa-me que a generalidade das pessoas com quem discuto este assunto pense da mesma forma: Cavaco é o líder da seita governativa. Engane-se quem ainda acreditar que este homem disputou Presidenciais recentemente.
O fenómeno da criação de seitas na política portuguesa é interessante. Em primeiro lugar, pela sua formação de acordo com o velho estilo siciliano Capo Regime ou regime de Capo. Depois, pela sua implementação em organizações políticas, criando todas as dependências pessoais e financeiras possíveis ao seu verdadeiro objectivo: crime e consequentes pactos de silêncio escudados pela omertà, o seu código de honra próprio. Qualquer cidadão minimamente informado e com acesso a algumas peças de investigação transmitidas conhece o caso BPN e sabe que o mesmo consubstancia a ascensão de um grupo mafioso. Uma ascensão partidária, com base em diferentes interesses, e sistémica, envolvendo variados agentes e caras como a de Cavaco Silva. Este caso pertence exclusivamente à esfera judicial e é tempo do mais alto magistrado da Nação se pronunciar.
Cavaco Silva é o percursor de um modo muito próprio de pautar a actividade política de um país: maiorias parlamentares sem prestação de contas, a contra-revolucionária bastonada, a mistificação do modus operandi europeu do Governo. E importa aqui referir essa mistificação, designadamente nestes dias de totalitarismo financeiro e soberania externa. Cavaco Silva herdou o poder num período histórico no qual se tomaram as mais importantes decisões da comunidade europeia. Estamos hoje em condições de avaliar as consequências do Tratado de Maastricht, nomeadamente da união monetária, e de equacionar a perda dos "poderes tradicionais do Estado", como à data referiu Mário Soares. Estamos igualmente em condições de afirmar que Cavaco é o responsável maior pelo estado a que Portugal chegou.
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