A guerra dos milionários contra Hollande
O ator Gérard Depardieu, que exilou-se na Bélgica para não pagar impostos na França, assumiu a liderança do movimento de rebeldia contra a política fiscal do presidente François Hollande. Ainda que longe do que havia apresentado durante a campanha presidencial, uma vez no poder Hollande aplicou um plano fiscal que reverteu em parte a tendência dos últimos 20 anos marcada por um constante favorecimento fiscal para os ricos. O artigo é de Eduardo Febbro.
Eduardo Febbro, em Carta Maior
Paris - Uma melodia patética se eleva sobre o céu da França: são as vozes dos milionários que clamam por “justiça” diante do que consideram um atropelo por parte do governo do presidente François Hollande: ou seja, a política fiscal do governo. A porcentagem de impostos paga pelos ricos voltou a ser um tema central da agenda política, muito mais do que a crise, a pobreza, a insegurança ou o desemprego. O socialismo governante se vê confrontado por um episódio tragicômico, ou melhor, uma comédia de milionário enojado protagonizada pelo ator francês Gérard Depardieu.
O ator assumiu a liderança do movimento de rebeldia contra a política fiscal do presidente François Hollande. Ainda que muito longe do que havia apresentado durante a campanha para as eleições presidenciais, uma vez no poder Hollande aplicou um plano fiscal que reverteu em parte a tendência dos últimos 20 anos marcada por um constante favorecimento fiscal para os ricos.
Enfurecido com a obrigação de deixar parte de seus ganhos para o fisco francês, Gerard Depardieu encarnou um dos papéis mais patéticos, vulgares e estúpidos de sua carreira, só que desta vez na vida real: depois de exilar-se na Bélgica para não pagar impostos na França, Depardieu renunciou a sua nacionalidade francesa e, ato contínuo, publicou uma carta aberta dirigida ao primeiro ministro Jean-Marc Ayrault. Após confessar que seguiria “amando os franceses”, Depardieu anuncia que já não tinha mais anda a fazer na França, acrescentando que estava saindo do país porque os socialistas “consideram que o êxito, a criação, o talento e a diferença devem ser sancionados”.
Daí em diante, o caso Depardieu tornou-se uma esquisita novela de milionários enojados com o poder. Mentiras, cifras falsas, alegações inexatas, insultos e gestos de uma baixeza sem precedentes encheram de tempero o debate sobre a política fiscal do governo. Os ricos fizeram de Depardieu seu emblema, o porta-bandeira da causa liberal contra o injusto governo socialista que os obriga a dar ao Estado alguns milhões a mais dos muitos milhões de que dispõem.
De fato, o ator francês – 170 filmes – seguiu os mesmos passos que outros milionários assustados com a doutrina fiscal do Executivo: foi se exilar em Néchin, na Bélgica. Situada há um quilômetro da fronteira francesa, Néchin, conta, entre sua população, com 28% de franceses, em sua grande maioria, exilados fiscais.
O primeiro ministro francês, Jean-Marc Ayrault, considerou “desprezível” o passo dado pela glória do cinema francês. Este respondeu-lhe dizendo que não estava preocupado em ser ou não francês e que o presidente Vladimir Putin havia oferecido a ele um passaporte russo. Depardieu tem agora mais amigos do que nunca e não precisamente entre a classe popular da qual era uma espécie de herói depois de ter interpretado no cinema o papel de Obelix. Mas este Obelix real resultou numa dor de cabeça para o governo, sobretudo porque longe de se limitar à figura de Depardieu e a de outros adeptos da evasão fiscal, o exílio dourado do ator deu lugar a um enfrentamento múltiplo entre atores, políticos, jornalistas e esses moralistas da moda que sempre aproveitam a onda para depositar seus ovos envenenados.
Em defesa do ator saiu a atriz Brigitte Bardot e, em um texto furioso, a atriz Catherine Deneuve. Brigitte Bardot fez uma pausa em sua já reconhecida militância em defesa dos direitos dos animais para defender agora um ser humano e acusar o governo de se livrar de um “ensinamento extremamente injusto” com o ator. Catherine Deneuve somou sua voz contra aqueles que saíram a atacar Depardieu.
Toda esta querela não é mais que uma artimanha política contra o anúncio feito pelo presidente François Hollande durante a campanha para sua eleição. Hollande disse que criaria um imposto de 75% para os ganhos superiores a um milhão de euros. Por enquanto, a medida não foi aprovada, mas o governo subiu os impostos para os mais ricos e também eliminou muitas isenções fiscais que favoreciam as grandes fortunas. Na verdade, há meio século, os regimes fiscais têm sido muito favoráveis aos ricos. Em 1985, a taxa de impostos era de 65% contra 41% em 2011. Tanto os governos de esquerda como os de direita aplicaram políticas fiscais muito favoráveis aos mais ricos.
Thomas Chalumeau, membro do think tank de esquerda Terra Nova, lembra que “os 20 bilhões de euros em baixa de impostos anuais beneficiaram os contribuintes mais abastados”. Um informe oficial do INSEE francês destaca que os ricos, graças a uma série de astúcias e medidas específicas, pagam 20% de imposto sobre seus ganhos quando deveriam pagar 41%. O mesmo especialista constata que “quanto mais dinheiro se têm, menos impostos se pagam”.
O escândalo Depardieu segue a cada dia aportando sua parcela de controvérsias e enfrentamentos. Em meio a uma crise colossal e a um desemprego galopante, Depardieu impôs sua agenda: tenham pena dos riscos! O ator, que acaba de colocar a venda sua casa em Paris pela quantia de 50 milhões de euros, é proprietário de bares, restaurantes, comércios e vinhedos em vários países.
Tradução: Katarina Peixoto
O ator assumiu a liderança do movimento de rebeldia contra a política fiscal do presidente François Hollande. Ainda que muito longe do que havia apresentado durante a campanha para as eleições presidenciais, uma vez no poder Hollande aplicou um plano fiscal que reverteu em parte a tendência dos últimos 20 anos marcada por um constante favorecimento fiscal para os ricos.
Enfurecido com a obrigação de deixar parte de seus ganhos para o fisco francês, Gerard Depardieu encarnou um dos papéis mais patéticos, vulgares e estúpidos de sua carreira, só que desta vez na vida real: depois de exilar-se na Bélgica para não pagar impostos na França, Depardieu renunciou a sua nacionalidade francesa e, ato contínuo, publicou uma carta aberta dirigida ao primeiro ministro Jean-Marc Ayrault. Após confessar que seguiria “amando os franceses”, Depardieu anuncia que já não tinha mais anda a fazer na França, acrescentando que estava saindo do país porque os socialistas “consideram que o êxito, a criação, o talento e a diferença devem ser sancionados”.
Daí em diante, o caso Depardieu tornou-se uma esquisita novela de milionários enojados com o poder. Mentiras, cifras falsas, alegações inexatas, insultos e gestos de uma baixeza sem precedentes encheram de tempero o debate sobre a política fiscal do governo. Os ricos fizeram de Depardieu seu emblema, o porta-bandeira da causa liberal contra o injusto governo socialista que os obriga a dar ao Estado alguns milhões a mais dos muitos milhões de que dispõem.
De fato, o ator francês – 170 filmes – seguiu os mesmos passos que outros milionários assustados com a doutrina fiscal do Executivo: foi se exilar em Néchin, na Bélgica. Situada há um quilômetro da fronteira francesa, Néchin, conta, entre sua população, com 28% de franceses, em sua grande maioria, exilados fiscais.
O primeiro ministro francês, Jean-Marc Ayrault, considerou “desprezível” o passo dado pela glória do cinema francês. Este respondeu-lhe dizendo que não estava preocupado em ser ou não francês e que o presidente Vladimir Putin havia oferecido a ele um passaporte russo. Depardieu tem agora mais amigos do que nunca e não precisamente entre a classe popular da qual era uma espécie de herói depois de ter interpretado no cinema o papel de Obelix. Mas este Obelix real resultou numa dor de cabeça para o governo, sobretudo porque longe de se limitar à figura de Depardieu e a de outros adeptos da evasão fiscal, o exílio dourado do ator deu lugar a um enfrentamento múltiplo entre atores, políticos, jornalistas e esses moralistas da moda que sempre aproveitam a onda para depositar seus ovos envenenados.
Em defesa do ator saiu a atriz Brigitte Bardot e, em um texto furioso, a atriz Catherine Deneuve. Brigitte Bardot fez uma pausa em sua já reconhecida militância em defesa dos direitos dos animais para defender agora um ser humano e acusar o governo de se livrar de um “ensinamento extremamente injusto” com o ator. Catherine Deneuve somou sua voz contra aqueles que saíram a atacar Depardieu.
Toda esta querela não é mais que uma artimanha política contra o anúncio feito pelo presidente François Hollande durante a campanha para sua eleição. Hollande disse que criaria um imposto de 75% para os ganhos superiores a um milhão de euros. Por enquanto, a medida não foi aprovada, mas o governo subiu os impostos para os mais ricos e também eliminou muitas isenções fiscais que favoreciam as grandes fortunas. Na verdade, há meio século, os regimes fiscais têm sido muito favoráveis aos ricos. Em 1985, a taxa de impostos era de 65% contra 41% em 2011. Tanto os governos de esquerda como os de direita aplicaram políticas fiscais muito favoráveis aos mais ricos.
Thomas Chalumeau, membro do think tank de esquerda Terra Nova, lembra que “os 20 bilhões de euros em baixa de impostos anuais beneficiaram os contribuintes mais abastados”. Um informe oficial do INSEE francês destaca que os ricos, graças a uma série de astúcias e medidas específicas, pagam 20% de imposto sobre seus ganhos quando deveriam pagar 41%. O mesmo especialista constata que “quanto mais dinheiro se têm, menos impostos se pagam”.
O escândalo Depardieu segue a cada dia aportando sua parcela de controvérsias e enfrentamentos. Em meio a uma crise colossal e a um desemprego galopante, Depardieu impôs sua agenda: tenham pena dos riscos! O ator, que acaba de colocar a venda sua casa em Paris pela quantia de 50 milhões de euros, é proprietário de bares, restaurantes, comércios e vinhedos em vários países.
Tradução: Katarina Peixoto
Nova centelha
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