Jerónimo de Sousa, 70 anos, é líder do PCP há 14 anos e ainda lhe faltam dois para terminar o mandato. Pelo menos. "Irei continuar a dar a minha contribuição", diz ao PÚBLICO e à Renascença.
Em entrevista ao PÚBLICO e à Rádio Renascença – que é emitida esta quinta-feira ao meio-dia –, o secretário-geral do PCP afirma que as políticas da União Europeia (UE) são responsáveis pelo crescimento da extrema-direita. E também que “o pedregulho de imposições” da UE é o maior empecilho a uma maior convergência com o PS
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No fim-de-semana passado tivemos a convenção do Bloco de Esquerda, na qual ficou muito claro que aquele partido quer ir para o Governo. O PCP quer ir para o mesmo Governo que o Bloco?
O que o PCP propõe é a ruptura com esta política que apresenta défices estruturais de fundo. Quando se fala de Governo, é evidente que o PCP, em relação ao poder, não se põe numa mera posição de partido de protesto. Mas coloca uma questão primeiro: um Governo para quê? Para quem? Para fazer que política? A ideia de querer participar no Governo a todo o custo, independentemente das políticas que esse Governo vai realizar, não corresponde à necessidade de um caminho novo e de uma política alternativa.
O que o PCP propõe é a ruptura com esta política que apresenta défices estruturais de fundo. Quando se fala de Governo, é evidente que o PCP, em relação ao poder, não se põe numa mera posição de partido de protesto. Mas coloca uma questão primeiro: um Governo para quê? Para quem? Para fazer que política? A ideia de querer participar no Governo a todo o custo, independentemente das políticas que esse Governo vai realizar, não corresponde à necessidade de um caminho novo e de uma política alternativa.
E em que políticas é necessário haver rupturas com o PS para poder haver um acordo de Governo?
Na forma de combater aquilo que são os défices estruturantes do nosso país, designadamente aumentar a produção nacional, que é a questão-chave e é daí que decorre depois o aumento do emprego - e também em relação à dívida: produzindo mais, devemos menos. Um outro eixo fundamental é a valorização do trabalho e dos trabalhadores, nos seus direitos, nos seus salários, na política fiscal, na legislação laboral. É preciso inverter aquilo que o PS teima em manter, como se verificou na proposta de lei da legislação laboral. É preciso também uma resposta efectiva a outros défices, como o da demografia. Não encontramos respostas nem solução duradoura. O défice agro-alimentar é outro problema, a questão dos serviços públicos, da saúde, da educação, da própria segurança social, o défice energético. O que verificamos é que o PS insiste em não encontrar respostas sólidas, a par desta questão central dos constrangimentos e das imposições da UE e do euro, que conduz a uma encanzinação - passe o termo - em relação à necessidade de desenvolvimento e crescimento económico. Encontra sempre ali barreiras...
Na forma de combater aquilo que são os défices estruturantes do nosso país, designadamente aumentar a produção nacional, que é a questão-chave e é daí que decorre depois o aumento do emprego - e também em relação à dívida: produzindo mais, devemos menos. Um outro eixo fundamental é a valorização do trabalho e dos trabalhadores, nos seus direitos, nos seus salários, na política fiscal, na legislação laboral. É preciso inverter aquilo que o PS teima em manter, como se verificou na proposta de lei da legislação laboral. É preciso também uma resposta efectiva a outros défices, como o da demografia. Não encontramos respostas nem solução duradoura. O défice agro-alimentar é outro problema, a questão dos serviços públicos, da saúde, da educação, da própria segurança social, o défice energético. O que verificamos é que o PS insiste em não encontrar respostas sólidas, a par desta questão central dos constrangimentos e das imposições da UE e do euro, que conduz a uma encanzinação - passe o termo - em relação à necessidade de desenvolvimento e crescimento económico. Encontra sempre ali barreiras...
O ministro dos Negócios Estrangeiros defendeu em entrevista, também aqui à Renascença e ao PÚBLICO, que um próximo acordo numa nova legislatura devia implicar as questões internacionais e europeias. Alguma vez será possível o PCP e o PS chegarem a acordo em matéria europeia?
A vida é dinâmica. O que é verdade hoje pode ser mentira amanhã. Existe esta dificuldade, este bloqueio, este pedregulho de imposições por parte da UE que condicionam qualquer perspectiva de que seja fácil uma convergência com o PS.
Não será fácil, mas da convenção do Bloco de Esquerda não saiu como linha vermelha o facto de o PS continuar a querer cumprir os compromissos europeus. Para fazer um acordo de Governo com o PS, o PCP exigiria que o PS abandonasse completamente a sua política europeia?
Estamos em crer que sem uma ruptura com essas concepções não há uma verdadeira política alternativa. Infelizmente, tem sido a vida a demonstrar que temos razão. Na actual conjuntura, verificamos avanços significativos na reposição de rendimentos e direitos dos trabalhadores e do povo português, mas depois quando precisamos de ser mais audaciosos em relação ao investimento público...
Estamos em crer que sem uma ruptura com essas concepções não há uma verdadeira política alternativa. Infelizmente, tem sido a vida a demonstrar que temos razão. Na actual conjuntura, verificamos avanços significativos na reposição de rendimentos e direitos dos trabalhadores e do povo português, mas depois quando precisamos de ser mais audaciosos em relação ao investimento público...
Em Fevereiro falávamos em contradições entre o PCP e o Governo que se podiam tornar insanáveis. Essa é uma das contradições insanáveis?
É uma contradição insanável que a vida coloca como uma grande questão na ordem do dia.
É uma contradição insanável que a vida coloca como uma grande questão na ordem do dia.
Mas o PCP não faz mesmo um acordo com um Governo PS na próxima legislatura por causa da Europa?
O PS não abdica da sua política europeia. Nós não abdicamos de princípios, valores e projectos que temos para a sociedade portuguesa em questões tão importantes como a dívida, o serviço da dívida, o défice orçamental e a renegociação da dívida. Nós não dizemos não pagamos, não é isso. Defendemos a renegociação. Hoje todos nos inquietamos com o desenvolvimento das forças xenófobas, racistas, mas a verdade é que este mandonismo da União Europeia é fonte de alimento de sentimentos... Mal ou bem, as pessoas assumem como questão fundamental poder decidir da vida e do futuro do seu país. E se a União Europeia é um obstáculo a isso - e é - surge como reflexo a resposta inquietante desses movimentos, que capitalizam para si a defesa da soberania e do desenvolvimento económico e social. A melhor resposta que se pode dar a essas forças é a garantia e a afirmação da nossa soberania nacional, não no quadro isolacionista, que não defendemos.
O PS não abdica da sua política europeia. Nós não abdicamos de princípios, valores e projectos que temos para a sociedade portuguesa em questões tão importantes como a dívida, o serviço da dívida, o défice orçamental e a renegociação da dívida. Nós não dizemos não pagamos, não é isso. Defendemos a renegociação. Hoje todos nos inquietamos com o desenvolvimento das forças xenófobas, racistas, mas a verdade é que este mandonismo da União Europeia é fonte de alimento de sentimentos... Mal ou bem, as pessoas assumem como questão fundamental poder decidir da vida e do futuro do seu país. E se a União Europeia é um obstáculo a isso - e é - surge como reflexo a resposta inquietante desses movimentos, que capitalizam para si a defesa da soberania e do desenvolvimento económico e social. A melhor resposta que se pode dar a essas forças é a garantia e a afirmação da nossa soberania nacional, não no quadro isolacionista, que não defendemos.
Este acordo correu bem? E vai correr até ao fim?
Correu, na medida em que, mesmo com todas as limitações, houve avanços na reposição de rendimentos e direitos. E eu acrescentava aqui uma questão: houve uma certa reposição da esperança do povo português de que era possível uma vida melhor. É um elemento subjectivo, mas que tem importância. O programa do Governo do PS era bastante limitado. Lembro-me que, durante as negociações, o PS fez uma grande força para que nós aceitássemos na posição conjunta a votação favorável dos orçamentos. Foi um momento muito sensível em que nós afirmámos claramente que não passávamos cheques em branco.
Correu, na medida em que, mesmo com todas as limitações, houve avanços na reposição de rendimentos e direitos. E eu acrescentava aqui uma questão: houve uma certa reposição da esperança do povo português de que era possível uma vida melhor. É um elemento subjectivo, mas que tem importância. O programa do Governo do PS era bastante limitado. Lembro-me que, durante as negociações, o PS fez uma grande força para que nós aceitássemos na posição conjunta a votação favorável dos orçamentos. Foi um momento muito sensível em que nós afirmámos claramente que não passávamos cheques em branco.
E o que é ainda possível concretizar mais nesta legislatura?
Contamos com avanços na protecção social em relação ao abono pré-natal e em relação aos cuidadores informais, aos desempregados de longa duração...
Contamos com avanços na protecção social em relação ao abono pré-natal e em relação aos cuidadores informais, aos desempregados de longa duração...
Em relação aos cuidadores informais o que está no Orçamento é no fundo uma declaração de boas intenções. O que se pode concretizar na especialidade?
A proposta do PCP defende apoios sociais para esse trabalho meritório e responsabiliza o Estado. Estamos ainda em fase de negociação.
A proposta do PCP defende apoios sociais para esse trabalho meritório e responsabiliza o Estado. Estamos ainda em fase de negociação.
E como vão votar a taxa da protecção civil?
Não estamos de acordo com a ideia da dupla tributação para os cidadãos que já pagam os seus impostos e que depois ainda teriam, no seu concelho, de pagar uma taxa, o que significaria pagar a dobrar. Não acompanhamos a proposta do Governo.
Não estamos de acordo com a ideia da dupla tributação para os cidadãos que já pagam os seus impostos e que depois ainda teriam, no seu concelho, de pagar uma taxa, o que significaria pagar a dobrar. Não acompanhamos a proposta do Governo.
Já é do domínio público que o primeiro-ministro António Costa prefere negociar com o PCP a negociar com o Bloco de Esquerda. Por que é que acha que isso acontece? Têm tido uma boa relação...
Há um elemento que me parece decisivo para que António Costa possa ter essa opinião, que é o rigor e o fundamento dos nossos posicionamentos e propostas. E a franqueza, a seriedade e a frontalidade com que sempre lidámos com o Governo. Um dos balanços que se podem fazer é que até aqui os compromissos que o Governo assumiu com o PCP foram cumpridos, o que não invalida a nossa crítica em relação a algumas matérias que o Governo se disponibilizou para resolver e depois começou a derrapar, a derrapar, a arrastar os pés...
Há um elemento que me parece decisivo para que António Costa possa ter essa opinião, que é o rigor e o fundamento dos nossos posicionamentos e propostas. E a franqueza, a seriedade e a frontalidade com que sempre lidámos com o Governo. Um dos balanços que se podem fazer é que até aqui os compromissos que o Governo assumiu com o PCP foram cumpridos, o que não invalida a nossa crítica em relação a algumas matérias que o Governo se disponibilizou para resolver e depois começou a derrapar, a derrapar, a arrastar os pés...
Tais como?
Por exemplo, a questão dos professores, das forças de segurança, até da justiça. Havia uma norma do Orçamento de 2018 para a reposição e contagem do tempo de serviço e de repente o Governo resolveu não materializar aquilo que está no Orçamento em vigor. Foi um caso em que o Governo não cumpriu a palavra dada. Vamos tentar alterar o decreto para repor o tempo de serviço dos professores e não chumbá-lo, ficando de mãos vazias.
www.publico.pt
Por exemplo, a questão dos professores, das forças de segurança, até da justiça. Havia uma norma do Orçamento de 2018 para a reposição e contagem do tempo de serviço e de repente o Governo resolveu não materializar aquilo que está no Orçamento em vigor. Foi um caso em que o Governo não cumpriu a palavra dada. Vamos tentar alterar o decreto para repor o tempo de serviço dos professores e não chumbá-lo, ficando de mãos vazias.
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