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terça-feira, 1 de maio de 2018

NO TEMPO DE UM CAVACO FASCISTA E UM 1º MAIO DE REPRESSÃO







Fatima Almeida in facebook

Ficou-me na memória as imagens da pancadaria e do desfile do funeral que saiu do CT da Boavista. Tinha 16 anos portanto foi à 36 anos. Hoje voltamos a recordar porque foi assim que o aniversário da minha mãe foi comemorado...
Na madrugada de 30 de Abril de 1982, a tentativa por parte da CGTP de instalar palcos na Avenida dos Aliados para a celebração do Dia do Trabalhador deu azo à mais brutal intervenção policial nas ruas do país depois do 25 de Abril de 1974. A actuação policial careceu de qualquer provocação séria e deixou no terreno, depois de mais de duas horas de batalha campal que se estendeu a varias áreas do Porto, pelo menos seis dezenas de feridos atendidos em hospitais, nove dos quais com ferimentos de bala e duas vítimas mortais: Pedro Manuel Sarmento Vieira, operário têxtil de 24 anos e o menor Mário Emílio Pereira Gonçalves, de 17 anos.
A origem dos confrontos está na pretensão da UGT de comemorar o 1º de Maio na baixa portuense, no mesmo local onde, desde Maio de 1974, a CGTP comemorava o Dia do Trabalhador, num contexto de grande tensão social e confronto entre as duas centrais.Neste quadro, o que sucedeu no Porto na madrugada do 1 de Maio só pode ser visto como (mais uma) provocação anti-sindical montada pelos sectores mais reaccionários da AD (com a sinistra figura do governador civil do Porto Rocha Martins a cabeça) com o concurso diligente da UGT. Esta pedira em ofício ao Governo Civil do Porto o uso da Praça Humberto Delgado para o 1º de Maio de 1982 a 27-4-1981, ou seja, dias antes do 1º de Maio de 1981. A CGTP, que sempre fizera a sua comemoração aí, fez o mesmo pedido a 4-5-1981, enquanto a CGTP parece ter seguido um procedimento normal e compreensível – pede a praça depois do 1º de Maio de 81 e com vista ao ano seguinte, e sempre no seu local habitual - a UGT preparava uma aposta forte no Porto, tentando fazer a sua manifestação numa zona central da cidade e onde a Inter se manifestava desde 1974 com uma estratégia provocatória: fazer entrar o seu pedido ainda antes da celebração do anterior 1º de Maio (de 1981).
A UGT anuncia publicamente a sua convocatória em finais de Março. O Governo Civil fala a favor da UGT e faz um apelo ao diálogo. Durante os dias prévios ao 1º de Maio assiste-se a uma escalada entre as partes, com declarações à imprensa a subir de tom. Torres Couto (da UGT) responsabiliza antecipadamente a CGTP por “eventuais provocações, agressões e confrontações que ocorram no 1º de Maio”. A Inter mantém o seu programa tradicional na Av. dos Aliados.No fim do dia 30 de Abril elementos da CGTP e da UGT começam a ocupar a Av. dos Aliados para preparar as comemorações do dia seguinte. Enquanto a UGT começa o seu espectáculo na parte alta da praça (junto aos Paços do Concelho) e os activistas da CGTP instalam um palco no lado sul para a manifestação do dia seguinte. A PSP estabelece um cordão entre os dois grupos e registam-se algumas cenas de provocação e cargas policiais sem grande violência. As conclusões do relatório da PGR esclarecem sem margem para dúvida que a situação em termos de ordem publica estava controlada e em nenhuma medida encontrava justificação para o que veio a acontecer depois.
Cerca das 23h30 aparecem as forças do Corpo de Intervenção da PSP destacadas de Lisboa, carregando brutalmente sobre tudo o que encontram à frente. A porrada dá rapidamente lugar ao uso de armas de fogo, num pandemónio de violência que espanta e indigna os presentes. Durante mais de duas horas são espancados cidadãos e registam-se dezenas de disparos por parte da polícia. Das vítimas mortais, Pedro Vieira é atingido pelas costas quando corria em direção à Av. Afonso Henriques, presumivelmente por uma bala em ricochete vinda de distância considerável.
Mario Emílio, a outra vítima mortal, é apanhado numa carga e devido ao seu estado convalescente terá optado por ficar à espera ao pé da polícia por não poder fugir a correr. Um polícia dispara-lhe à cabeça duas vezes quando passa por ele. Segundo a PGR o Mário é virtualmente executado por um elemento policial (Relatório da CI da PGR, 102), qualificando a sua morte de crime de homicídio voluntário tipificado na lei (107). Foram abertas varias investigações sobre os acontecimentos. Não se conhecendo porém, qualquer desenvolvimento penal relativo aos mesmo
Durante o dia 1 de Maio, as duas comemorações decorrem na Av. dos Aliados. A UGT não suspende o seu programa de variedades apesar do sangue derramado e apenas congrega umas centenas de pessoas. Por seu lado a CGTP suspende as actividades lúdicas e organiza um comício na praça durante a tarde. A PSP do Porto dispõe um cordão entre as manifestações mas não acontecem novos incidentes.
No dia 4 de Maio a CGTP convoca uma greve geral para uma semana depois. No dia 5, dezenas de milhar participam nos funerais dos falecidos numa das maiores manifestações de sempre na cidade do Porto, que o então secretário-geral da UGT Torres Couto qualificou como “uma passeata com caixões”. A greve geral de luto de 11 de Maio de 1982 voltou a ser um momento alto de combatividade.

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