lon chaney
(LON CHANEY, LONDON AFTER MIDNIGHT, 1927)
Começa a ser penoso assistir à desonestidade política do PS setubalense na pré-campanha eleitoral para as autárquicas.
Convencidos de que encontraram a melhor arma de arremesso possível, agarram-se à questão das taxas máximas do IMI praticadas no concelho para um exercício da mais apurada — mas pouco fina — demagogia, desonestidade e absoluta incoerência política.
Estas são, aliás características a que o PS nos habituou e das quais dificilmente abrirá mão. Fazem de tal modo parte do seu código genético que não podem viver sem a aldrabice, a meia verdade, o jogo político baixo de que todos estamos fartos.
A propósito do IMI em Setúbal, e antes de qualquer outra consideração, importa destacar a absoluta incoerência do PS, que introduziu neste concelho como protagonista político a ainda presidente socialista da Câmara Municipal do Montijo, autarquia que, como a de Setúbal, pratica, desde sempre, as taxas máximas de IMI, sem que a tal seja obrigada por um Contrato de Reequilíbrio Financeiro que só teve de ser celebrado em Setúbal para garantir que a autarquia setubalense não ia à falência em 2004 e para pagar os 30 milhões de euros de dívidas a fornecedores deixados por Mata Cáceres, impossíveis de pagar na altura por falta de liquidez e por a capacidade legal de endividamento da câmara estar esgotada.
O PS, e o seu candidato à Câmara Municipal de Setúbal, omitem sistematicamente este ”detalhe”, na esperança de que ninguém dê pela incoerência, e vai alegremente entretendo-se em atirar pedras aos telhados do vizinho.
Também no Montijo a maioria PS na Assembleia Municipal recusou, em anos anteriores, propostas de redução do IMI. Também aí não se viu uma lágrima vertida pelos proprietários montijenses, com a diferença de que, hoje, face à reavaliação dos imóveis decidida pelo Governo e executada em deficientes condições que apenas visaram a maximização da cobrança de receita fiscal, os valores patrimoniais que resultaram dessa reavaliação terem ditado aumentos muito consideráveis do IMI a pagar. Mas, também aqui, não é às autarquias, sejam elas do PS ou da CDU, que se podem imputar responsabilidades. Neste caso, apenas o Governo que mais aumentou impostos na nossa história recente, ainda que se considerem os mais liberais de sempre, pode ser responsabilizado, com a agravante de, unilateralmente, ter decidido reter indevidamente, para custos imputados ao processo de reavaliação, uma boa parte da fatia do IMI que era devida às câmaras municipais. Também por esta via se criaram ainda mais dificuldades às autarquias, já afetadas pelos sucessivos cortes nas transferências do Estado ditadas por alterações à Lei das Finanças Locais.
Em tempo de eleições, porém, vale tudo e nada disto comove o PS.
No Montijo, os proprietários de imóveis sofreram, este ano, com a reavaliação, enormes aumentos neste imposto. Parece, porém, que, para o PS, este munícipes podem e devem pagar sem reclamar, mas já em Setúbal o assunto muda de figura.
No Montijo, aliás, a autarquia PS chegou até a praticar, no fim dos anos noventa, valores mais elevados de Contribuição Autárquica, o antecessor do IMI, do que a autarquia PS liderada em Setúbal por Mata Cáceres. Por isso, o presidente da Câmara setubalense na altura se apelidava a si próprio de “campeão da contribuição autárquica no distrito”…
O mais curioso, porém, é que o PS, em Setúbal, já em situação financeira difícil, optou, em 2000 e 2001, por baixar os valores da Contribuição Autárquica, numa operação que só pode ter uma justificação eleitoralista, face ao processo eleitoral de 2001 que se aproximava e à já então evidente degradação da base de apoio local do PS. A verdade é que as contas municipais ainda mais depauperadas ficaram e nem assim o PS conseguiu, em 2001, ganhar as eleições.
Os que vieram atrás tiveram de fechar a porta. Fizeram-no, como é sabido, com o famoso Contrato de Reequilíbrio Financeiro, cujas causas e origens o PS se esforça arduamente por esquecer.
É importante referir que o PS, com má consciência e ciente das responsabilidades que tinha na situação financeira da câmara municipal em 2001, quando perdeu as eleições, não se opôs, na Assembleia Municipal, em reunião realizada em 30 de dezembro de 2002, à declaração de rutura financeira, primeiro passo necessário à celebração de um CRF – Contrato de Reequilíbrio Financeiro. O PS, de acordo com o que declarou o seu porta-voz nesta reunião “não via qual era o problema em votar favoravelmente aquele documento [a declaração de rutura financeira], caso tivesse sido discutido previamente. Aquele documento, com uma análise ou uma concertação pela sua bancada era perfeitamente possível ser aprovado”. Encontrado o pretexto, o PS viria a abster-se nesta votação.
A mesma posição de abstenção foi assumida pelo PS em 29 abril de 2003 na votação da proposta do CRF a apresentar ao Governo. Nesta sessão da Assembleia Municipal, o Partido Socialista defendeu, em declaração de voto, que a Câmara Municipal de Setúbal poderia ter aproveitado uma alegada capacidade de endividamento que ainda teria no início de 2002 para pagar dívidas a fornecedores e outros credores que, diziam os eleitos do PS, tinham “entretanto atingido valores incomportáveis”, esquecendo, porém, que se estava a referir a dívidas contraídas na totalidade pela anterior gestão do PS. Ou seja, o Partido Socialista defendia, na altura, que a Câmara Municipal de Setúbal se endividasse mais, isto porque entendia que a capacidade de endividamento não estaria esgotada.
Toda a declaração de voto é, aliás, um fino exercício de falta de seriedade política que culmina com o deputado a afirmar que, embora o PS “discorde da forma como o Executivo tem vindo a gerir a autarquia [a CDU governava a câmara há apenas um ano e quatro meses, sem qualquer capacidade financeira que não fosse a necessária para, com enorme dificuldade, assegurar os encargos de funcionamento], bem como a forma pouco correta como tem procurado atirar para cima dos anteriores executivos a culpa pela atual situação financeira, a bancada do PS não vota contra o CRF para não prejudicar a margem de negociação junto do Poder Central e na perspetiva de que a aprovação do contrato permita liquidar as dívidas da câmara às muitas dezenas de empresas, em especial pequenas e médias, às coletividades, às instituições, aos artistas e a muitos outros credores individuais”.
Em síntese, ao abster-se nestas votações com fracos pretextos, o PS, na prática, caucionou o CRF e, por essa via, a aplicação de valores máximos nas taxas e tarifas municipais, bem como no IMI e na derrama, que agora tanto contesta, ainda que se esqueça de fazer o mesmo no Montijo.
Claro que esta é uma história longa, recheada de episódios e intricadas questões financeiras e jurídicas difíceis de explicar. O PS sabe disso e empenha-se na construção de uma nova narrativa que oculte a irresponsabilidade financeira que praticou durante mais de uma década na autarquia setubalense. Basicamente, o único princípio válido para os socialistas setubalenses é o do vale tudo…
PS (aqui como Post scritum, está claro) – O candidato do PS distribuiu, na cidade, um jornal de campanha com uma entrevista sua recheada de pérolas. São muitas e seria difícil dissecar todas. Há, porém, duas que, pela piada que têm, vale a pena destacar.
A primeira é a das lágrimas que verte a propósito da taxa de proteção civil. Aqui, o candidato é contido e não vai além da referência à taxa, na esperança de angariar simpatias.
Compreende-se.
 É que esta taxa foi criada pelo Secretário de Estado da Proteção Civil de um Governo do PS, Ascenso Simões, que resolveu, desta brilhante forma, a reivindicação que os vários municípios que são detentores de corpos de bombeiros profissionais apresentavam há anos (entre os quais Setúbal) e que, na base, defendia que o poder central também se devia responsabilizar pelo financiamento destas companhias de bombeiros, já que prestam um serviço que, em primeira instância, é uma obrigação do Estado. O PS, tão lesto na crítica a esta taxa, não só a criou, como a aplica noutros concelhos, com uma diferença essencial: aplica-a, o PS e o PSD, indiscriminadamente a todos os cidadãos, ou por via de um valor fixo cobrado da fatura da água, ou por via do valor patrimonial dos edifícios, a partir do qual é calculada a taxa a cobrar a esses proprietários. Em Setúbal, com base numa tabela de risco, a taxa apenas é cobrada a estabelecimentos comerciais e a estabelecimentos industriais, ficando os restantes munícipes de fora.
O interessante da história é, sobretudo, que o PS, manifestando, uma vez mais, a sua profunda incoerência e falta de seriedade, contesta uma taxa municipal por si criada enquanto Governo apenas para atacar, numa conjuntura muito precisa, um adversário político. Nada de novo portanto…
A outra pérola, essa verdadeiramente brilhante, é quando afirma que “teria sido uma coligação natural em Setúbal [a que se faria entre a CDU, o PSD e o CDS]”. E acrescenta, com ar sisudo, que “já não seria a primeira vez”, para, a seguir, rematar, definitivo: “estiveram juntinhos para pôr lá o Passos Coelho”. Esta última mereceria um tratado, tal é a estupidez da pretensa ironia, mas o que interessa aqui são as alegadas coligações locais. Uma afirmação destas, vinda de um partido que, no governo, já esteve coligado com o PSD e o CDS e que se está a pôr a jeito para mais um arco de governabilidade com o Partido de Portas só pode ser encarada como uma boçalidade risível vinda de quem acredita que somos todos parvos. Mais boçal ainda é, porque esquece — talvez por pura ignorância, admitamos — que o PS esteve, no seu primeiro mandato na Câmara Municipal de Setúbal, entre 1985 e 1989, coligado com o PSD, com os efeitos nefastos que são conhecidos no urbanismo da cidade.
A coisa é, pois, má demais para ser verdade.
Custa a entender como é que o PS local aceita um candidato destes. Ou então não e é o que lá arranjaram…
E tanto que Setúbal necessitava de uma oposição credível!

Praça do Bocage