L'Osservatore Romano.
As diabruras do jornal do Vaticano
O jornal debruça-se sobre temas improváveis: a irmã da Catwoman é freira e o Batman é católico
Nem só de orações, ensaios teológicos e temas santos vive o jornal do Vaticano. De tempos a tempos, as páginas do "Osservatore Romano" são preenchidas com críticas a filmes e discos profanos, além de crónicas sobre os temas mais improváveis e com conclusões surpreendentes. Segundo o jornal do Papa, Homer Simpson, Hulk e o Batman são católicos. O melhor disco de rock de sempre pertence aos Beatles - apesar de em 1966 Jonh Lennon até ter dito que a banda era mais popular do que Jesus. A Catwoman é pouco devota, o Harry Potter assim-assim e o Tintin é, definitivamente, um herói católico. Já a Barbie - que teve honras de capa no jornal do Vaticano - precisa de crescer. E um dos filmes favoritos da santa crítica pertence à série James Bond: "Skyfall".
Em 2007, o "Osservatore Romano", fundado há 151 anos, conheceu um ponto de viragem: a seguir à entrada de Gian Maria Vian para o cargo de director, o jornal passou a apostar em temas da cultura popular, numa tentativa clara de agarrar novos leitores. O último artigo do género - que, por conter uma certa dose de excentricidade, acabou replicado em quase todos os jornais do mundo - é uma análise à fé dos super-heróis.
O ensaio chama-se "Hulk é verdadeiramente católico?" e conclui que o herói verde é claramente católico, desde logo porque se casou pela Igreja e aparece várias vezes com um rosário nas mãos. Segundo o "Osservatore Romano", Batman também é católico - porque aparece a rezar, em criança e porque a mãe, assegura o jornal, é devota.
Menos santa será a Catwoman que tem uma irmã freira. Depois, diz o artigo, existem outros super-heróis que são religiosos, apesar de não serem católicos, facto que o jornal do Vaticano atribui ao protestantismo nos Estado Unidos. O Homem Aranha, por exemplo, é um "protestante convicto", o Capitão América vai à missa todos os domingos, mas à semelhança do Super-Homem, pertence à Igreja Metodista.
Se para os mais cépticos as teorias do jornal do Vaticano parecem desprovidas de sentido, os cronistas da Santa Sé acreditam que qualquer super-herói encerra uma vertente espiritual: "Porque combatem as injustiças do mundo, a prepotência dos gananciosos e intervêm para restabelecer uma ordem momentaneamente perdida". O "Osservatore Romano" termina a reflexão dizendo que o mundo actual precisa cada vez mais, de super-heróis: "Heróis positivos e justos que, na eterna luta entre o bem e o mal, sabem sempre de que lado devem estar".
HOMER E BART SÃO CATÓLICOS
Parece impossível, mas segue-se a explicação, que remonta a 2010. A série "Os Simpsons", segundo o jornal do Vaticano, explora assuntos como "a noção de família, de comunidade, a educação e questões ligadas à religião, de uma forma como poucas séries de televisão fazem". O "Osservatore Romano" até admite que Homer adormece quase sempre na Igreja e ridiculariza, em todos os episódios, o vizinho evangélico, Ned Flanders.
Mas num artigo chamado "Homer e Bart são católicos", o jornal sublinha que a família "reza antes das refeições e, à sua maneira, acreditam na vida depois da morte". "Poucas pessoas sabem disso, e fazem de tudo para esconder esse facto, mas é verdade: Homer é católico", insiste o "Osservatore Romano" - que dá como exemplo um episódio de 2005, chamado "O pai, o filho e o santo actor convidado", em que Bart é expulso da escola pública e transferido para um colégio jesuíta, onde decide converter-se graças a um padre. A voz do sacerdote é de Liam Neeson (o tal "actor convidado"). No mesmo episódio, Homer decide também tornar-se católico - perante o horror da mulher e dos vizinhos.
MELHORES DISCOS DECENTES DE ROCK
Há muitos anos, a Igreja chegou a defender que a música rock é uma espécie de obra do Diabo. Mas recentemente o "Osservatore Romano" publicou um artigo sobre os "Melhores discos de rock decentes". A lista é encabeçada pelo álbum "Revolver" dos Beatles e continua com o "The Dark Side of the Moon" dos Pink Floyd, o best-seller de 1995 dos Oasis "(What's the story") Morning Glory?" e "Thriller" do Michael Jackson - que os jornalistas Giuseppe Fiorentino e Gaetano Vallini descreveram de forma elogiosa: "Algumas canções parecem ter sido escritas ontem e outras dão arrepios na espinha pela sua simplicidade iluminada". Na lista do jornal figuram ainda discos do U2, Fleetwood Mac ou Paul Simon. Quem ficou de fora foi Bob Dylan que, apesar de ser um óptimo poeta, "abriu caminho a toda uma geração de cantores e compositores não profissionais que atormentam os ouvidos e a paciência de quem os ouve com as suas histórias atormentadas".
HARRY POTTER NÃO É MAU DE TODO
Os primeiros filmes do Harry Potter são altamente desaprovados pelos críticos do Vaticano - que chegaram a classificar a saga de "antipedagógica e anticristã". Também o exorcista emérito da diocese de Roma, Gabriele Amorth, avisou várias vezes que o pequeno feiticeiro incita a práticas de bruxaria e esoterismo - altamente incompatíveis com o convívio com Deus.
Mas os críticos do "Osservatore Romano" mudaram de ideias e, na véspera da estreia de "Harry Potter e o Príncipe Misterioso", em 2009, elogiaram o filme - por "reflectir sobre a ideia do combate entre o bem e o mal e mostrar que para o bem vencer às vezes são precisos custos e sacrifícios". O filme recebeu duas estrelas .
BEATO DO PAU DURO
|
TINTIN É UM HERÓI CATÓLICO
Em 2011, o jornal do Vaticano dedicou as páginas centrais e uma chamada de capa ao repórter criado por Hergé em 1929. Tintin é, segundo o "Osservatore Romano", "um cavaleiro ocidental dos tempos modernos com um coração sem mácula". No mesmo artigo, assinado pelo escritor francês Dennis Tillinac, admite-se que Tintin não é um católico que possa ser identificado como tal - uma vez que nunca reza perante a ameaça da morte e nunca foi visto numa igreja. Mesmo assim, continua o ensaio, "Tintin é um herói do catolicismo, impregnado dos ideais dos escuteiros, que tiveram grande importância na formação de Hergé, como demonstram as suas primeiras histórias". Além disso, o jornal sublinha que há pelo menos dois momentos em que Tintin deixa escapar a expressão "Deus o tenha" - quando é informado da morte de um vilão japonês em "O lótus azul" e de dois piratas em "O tesouro de Rackham, o Vermelho".
A BARBIE TEM DE CRESCER
No Verão do ano passado, a Barbie apareceu em grande destaque na capa do jornal do Vaticano. A jornalista Giulia Galeotti recordou o percurso da boneca desde o final da década de 1950 e lançou-se numa reflexão improvável. "Surge, contudo, uma dúvida: quantos de nós já encontraram uma Barbie calva nas lojas, que poderia tranquilizar as crianças cujas mães estão sob quimioterapia? Por que é que a Barbie não cresce realmente? Quem sabe, talvez, seja necessária finalmente uma nova versão da sublime "Barbie Girl". Os Aqua estão avisados", escreveu.
JAMES BOND APROVADO
Também no ano passado, o jornal dedicou cinco artigos ao filme "Skyfall" - o melhor de todos os da série James Bond e o primeiro a afastar-se de "clichés".
O "Osservatore Romano" elogiou a personagem M - interpretada pela actriz Judy Dench - por mostrar a "fragilidade de uma mulher que se esconde por trás da máscara fria de chefe do poderoso MI6, tornando-a menos distante e mais interessante".
Sem comentários:
Enviar um comentário