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sexta-feira, 14 de dezembro de 2012


Alta tensão.












 
No recente e excelente livro de David Marçal e Carlos Fiolhais Pipocas com Telemóvel e Outras Histórias de Falsa Ciência (Gradiva, 2012), e também no blogue De Rerum Natura, fala-se do receio, que existe entre muitos cidadãos, motivado pela suposta existência de uma relação de causalidade entre as redes electromagnéticas emitidas por instalações eléctricas, em particular as linhas de alta tensão, e algumas formas de cancro. Em 2007, um grupo de cidadãos de Silves chegou a fazer uma greve de fome às portas da Assembleia da República.   
 
 

Por essa altura, pretendia-se instalar uma linha de muito alta tensão entre as sub-estações de Fanhões e Trajouce, no concelho de Sintra. Perante a contestação das populações, que levou à instauração, com sucesso, de uma providência cautelar da Junta de Freguesia de Monte Abraão contra a REN, esta optou pelo enterramento das linhas. Segundo um responsável da empresa, tratou-se de uma «insistência da Câmara Municipal» de Sintra e tudo decorria da «ignorância» das populações e dos cientistas. Em suma, um «falso problema», nas palavras do administrador da REN, Henrique Gomes.

Estas declarações foram feitas à margem da assinatura de um memorando entre a REN e a Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa para a criação de um centro de investigação que, durante dez anos, iria observar os eventuais efeitos na saúde dos campos electromagnéticos. «A grande inovação internacional deste centro é ter um programa de estudos de longa duração que faça com que a informação seja construída ao longo do tempo, credível e não pontual», disse à LUSA o geneticista Carolino Monteiro, coordenador científico do CITEC.  «A informação disponível é contraditória e sobretudo ambígua», assim justificava o Professor Carolino Monteiro a criação do CITEC. Para o geneticista de Farmácia, a informação disponível era «ambígua»; já para o administrador da REN tudo não passava de um «falso problema».  


 
Apesar de se tratar de um «falso problema», segundo o Expresso de 12 de Janeiro de 2008, a REN dispôs-se a investir, num «projecto científico pioneiro», 37 milhões de euros (repete-se: 37 milhões de euros) para criar o CITEC (Centro de Investigação Científica e de Inovação Tecnológica), cuja coordenação científica caberia à Faculdade de Farmácia.






Passados quatros anos, não se sabe o que aconteceu ao CITEC. Uma pesquisa na Internet permite verificar que existe um CITEC, mas encontra-se instalado na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, a prestigiada UFVJM. Há também um CITEC em Pré-Moldados. Em Aracaju, Sergipe, no nº 2208 da Avª Chanceler Osvaldo Aranha. No país-irmão, florescem CITEC’s. Há a CITEC – Comissão para Incorporação de Tecnologias, no Ministério da Saúde. Temos também o CITEC – Centro Industrial Técnico de Concreto, em Maceió. E quem estiver em Jabuti, Itaitinga, pode fazer as suas obras de casa na CITEC – Comércio, Indústria e Tecnologias Em Construção, Ltda. Este CITEC é sito na «Rua José Rebouças Lins, ao nº 2020, Quase Esquina Com Av. Dep. Paulino Rocha» Portanto, ao chegar à Avenida Deputado Paulino Rocha, na «Quase Esquina» tem a Rua José Rebouças Lins. Siga até ao nº 2020.
Em Portugal, o CITEC mais conhecido é o Centro de Iniciação Teatral Ester de Carvalho. Em Montemor-o-Velho (Rua Dr. José Galvão, 100). 
 
 
 
Quanto ao CITEC da Faculdade de Farmácia, anunciado publicamente em Janeiro de 2008, proclamado como um «projecto científico pioneiro», onde a REN iria investir 37 milhões de euros, não se sabe dele. De facto, era estranho que a REN fosse estudar uma realidade que sabia, à partida, que não trazia malefícios para as pessoas. Seria um desperdício gastar 37 milhões de euros a estudar um «falso problema», algo que só por «ignorância» as populações receiam: as linhas de alta tensão. Ou será que o dinheiro foi mesmo investido? Onde pára o CITEC, porque não avançou o projecto? Se o mesmo se destinava a investigar os efeitos dos campos electromagnéticos na saúde das pessoas (cancro!), se foi anunciado solenemente numa altura em que as pessoas se moviam contra as linhas de alta tensão, porque não se avançou? É óbvio, mais do que óbvio, que não se tratou de uma encenação para acalmar os ânimos das populações. Uma empresa como a REN e uma faculdade como Farmácia não fariam uma coisa dessas. Que fique muito claro: isso não está em causa. O que está em causa é sabermos se chegou a criar-se o CITEC ou, caso contrário, qual o motivo que levou a não avançar com este «projecto científico pioneiro». Se o anunciaram solenemente, com notícias que chegaram ao Brasil e a Espanha, porque não explicaram o que aconteceu depois? Haverá razões mais do que legítimas para abandonar o projecto, mas, pura e simplesmente, não as conhecemos. Na Internet, não conseguimos saber o que se passou ou não passou.     
Onde está o CITEC? Para onde foi o dinheiro, se é que chegou a ir? Para Aracaju, para Mucuri, para Maceió, para os Vales de Jequitinhonha? Ou terá a REN investido 37 milhões de euros no Centro de Iniciação Teatral Ester de Carvalho, em terras de Montemor-o-Velho?
 
 
António Araújo
Malomil

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