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terça-feira, 24 de outubro de 2017

COMUNAS PARA A FOGUEIRA


Gritou-se hoje em Portugal numa manifestação que era para ser silenciosa.
É desnecessário mandares-nos para a fogueira. Não te queremos mal... aliás, a nossa superioridade moral está precisamente aí: nós queremos o melhor para todos, inclusive para ti...
Entendo que o teu medo te leve a essa atitude do “comunistas para a fogueira”. O teu medo dos comunistas é o medo do Futuro.
Tens medo da mudança que aí vem. Tens medo que os comunistas fiquem com a tua parte das migalhas repartidas e te nacionalizem a gasolina e o gasóleo que pagas para trabalhar. Tens medo que os comunistas te roubem a tua casinha que nos próximos trinta anos vais continuar a pagar ao banco e que será apenas tua nas vésperas de te apagares...
Tens medo que a tua filha se apaixone por um adolescente comunista e que perceba que o amor é uma coisa que se faz em liberdade.
Tens medo que se crie uma sala de espetáculos aproveitando a acústica da basílica de Fátima e que um dia seja o circo de Moscovo a atuar em vez do de Roma.
Tens medo que dê uma coisinha à tua mulher, (mulher não, esposa em comunhão com deus!!), que lhe dê um surto e queira arrancar as teias de aranha da monotonia do vosso sagrado casamento, ardendo numa fogueira de paixão com um comunista mal vestido... tens medo e pesadelos com ambos a enrolarem-se no banco de trás do carro (está quase pago!) entre o avante e a mala LV (uma cópia boa!!) que tu lhe ofereceste.... tens pesadelos de saberes que vão os dois em tardes clandestinas para o motel. Tens medo, e por isso sugiro que verifiques o extrato do cartão – se lá estiver requinte30 euros e não foste tu... já sabes: é ela com um comunista!!!!
Também tens medo por ti, mesmo tu, deus-te-livre, se ainda tiveres aí dentro dessa gosma que te enche por dentro, algum rasgo de emoção, podes vir (livra-cruzes-canhoto) a apaixonares-te e a envolveres-te com uma dessas mulheres livres e comunistas... Uma dessas que já trocou de marido umas quantas vezes e que a cada ano que passa está mais... livre, bela e comunista.
Tens medo, meu fascistazinho em botão. É o medo que te faz acender a fogueira onde nos queres queimar...
Se ainda não percebeste, vou dizer-te: não adianta querer-nos na fogueira, porque nós somos a fogueira.
Esta tarde quiseste uma fogueira. Ontem à noite no Tarrafal era a frigideira. Hoje de manhã eram as piras de livros a arderem nas ruas de Santiago do Chile...
De nada adiantou, e não resolveste o teu medo. Nós, os comunistas continuamos bem acesos.
Ardemos na febre que consumiu o Bento Gonçalves sem tratamento médico dentro da prisão que tu fizeste. Ardemos, reorganizamo-nos tornamo-nos mais fortes. Ardemos em celas de isolamento, torturas, traições, propaganda, silenciamento, intrigas e anunciados fins... mas, e mesmo assim, hoje continuamos a ser um problema para ti. Porque continuamos a arder.
Ardemos hoje na fogueira do desemprego e do trabalho precário. Ardemos nos estágios não remunerados.
Ardemos no fogo brando dos empregos de verão “enquanto não aparece outra coisa”. Ardemos quando derretemos o alcatrão para fazer estradas e soldamos vedações das fábricas.
Ardemos em vertigens a subir a andaimes ou a limpar as janelas exteriores de vidro das salas de direção no topo dos edifícios.
Ardem-nos os pés de andar para trás e para a frente a tirar fotocópias e a imprimir ofícios. Ardem-nos as canelas de fazer dezenas de quilómetros atrás do balcão a tirar bicas e a aviar sandes de torresmos. Ardem-nos as pernas de percorrer as calçadas a distribuir as cartas que são contas que nos vamos ver fritos para pagar. Arde-nos a cintura de esquivar as rasteiras dos fregueses mal intencionados. Ardem-nos as tripas de viver e lidar com a injustiça. Arde-nos o peito da angústia da chegada de mais um fim do mês, sem saber como vai ser. Ardem-nos as costas de carregar todos os dias as tuas malas no aeroporto. Ardem-nos os braços de descarregar caixotes de fruta que tu decidiste importar. Ardem-nos as mãos dos detergentes com que lavamos gabinetes, corredores, ruas e cidades. Ardem-nos os olhos de olhar para o monitor minúsculo da registadora do hipermercado, a registar as compras que nem sempre podemos fazer. Ardem-nos os dedos da tesoura de cortar os cabelos, de cortar as sebes, de cortar os cabos e de cortar a luz aqueles que arderam porque não pagaram a conta. Ardem-nos e zumbem-nos os ouvidos de ouvir tantas vezes não ao telefone, quando ganhamos a vida a vender os créditos que enchem os bolsos daqueles que, como tu, nos querem pôr na fogueira.
Ardemos nos armazéns a fazer inventários das tuas coisas. Arde-nos a cabeça de registar apólices, estratos, saldos, fazer seguros a barcos que nunca vamos poder comprar e a gerir contas que nunca serão nossas. Ardemos a conduzir autocarros, camiões, carrinhas, motas e bicicletas. Ardemos a vender bilhetes, vender farturas, vender gelados ou a vender casas. Ardemos nos hospitais a fazer das tripas vontade e dos corações gasolina, para não deixar morrer os velhos que despejaste. Ardemos nas salas de aula a ensinar os teus filhos, esses mesmos que deixaste na escola e não consegues educar em casa. Ardemos em casa e nos transportes a fazer contas de sumir e à espera de melhores dias que teimam em tardar. Ardemos em infinitas noites de reunião nos centros de trabalho com as paredes manchadas de humidade e amarelas de décadas de cigarros acessos e ardidos entre intermináveis discussões de estratégias de luta. Ardemos dentro de fardas, ardemos dentro dos fatos-macaco, das batas, das camisas com laço, dos fatos-e-gravata e dentro de todas as roupas que nos obrigas a vestir.
Nós somos a fogueira. É essa a nossa natureza. É bom que nos temas. O nosso fogo, ainda por cima é contagioso... É o fogo com que se cozinha o futuro e as conquistas de amanhã.
É por tudo isto que só me resta perguntar-te, meu fascistazinho de merda, como queres que te sirva a tua história? Bem ou mal passada?
Helder Menor

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