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quarta-feira, 15 de março de 2017

ENTREVISTA COM BERNARDINO SOARES "Governo está a meio da ponte. Ou continua o caminho ou volta a cair"


Deputado ao longo de 18 anos, Bernardino Soares não se imagina a voltar à Assembleia da República. Mas nem por isso o atual presidente da Câmara de Loures deixa de comentar o que se passa no Parlamento.

O entrevistado do Vozes ao Minuto de hoje, faz a sua análise ao Governo de António Costa, que considera ter pernas para andar se continuar a seguir o caminho proposto sobretudo pelo PCP. Caso contrário, corre o risco de cair.

Que análise faz ao governo de António Costa?
É um Governo que por causa da solução política que o suporta inverteu algumas das medidas negativas do governo anterior, concretizou algumas melhorias e alguns avanços que são importantes e agora está um bocadinho a meio da ponte, entre continuar nesse caminho, com maior ou menor velocidade, com medidas como defende o PCP - procurar ganhar mais direitos para os trabalhadores, aumentar as condições dos serviços públicos e outras medidas desse tipo - ou voltar a cair ou continuar nas regras neoliberais da União Europeia e que, aliás, o PS sempre defendeu enquanto esteve no Governo.
O que é necessário para que siga em frente nessa ponte?
É preciso ter não só um forte investimento nos salários, nos rendimentos, nas reformas, nos salários, nas pequenas empresas, através do consumo interno, como um grande pendor de investimento público. E estamos com o investimento público mais baixo de sempre há varias décadas. Precisamos de mais investimento público. Cada milhão de investimento, em regra, dizem os economistas, potencia oito milhões de investimento privado. É claro que é uma regra da macroeconomia e na realidade pode não ser bem assim, mas a verdade é que não há nenhum país que se tenha desenvolvido a partir de uma situação de recessão, como foi o nosso caso, sem uma forte intervenção de investimento.
A História lembrará que, na noite das eleições, o Partido Socialista fez um discurso de derrota e foi só após os desafios do PCP que essa situação se inverteuPrecisamos de ter mais investimento público nem que para isso seja necessário romper com as regras do défice, porque estas são um garrote que nos limita o desenvolvimento.
Depois há também a questão da distribuição da riqueza. Temos de acabar com os benefícios aos grandes grupos económicos, aos setores mais poderosos do país e aumentarmos uma distribuição da riqueza mais justa em relação à população, a quem trabalha e a quem já trabalhou. Por outro lado, matérias como a legislação laboral e o combate à precariedade também são muitíssimo importantes. Uma das coisas que mais condiciona a vida dos trabalhadores no nosso pais é a precariedade, é não saber se no próximo mês ou dali a seis meses vão ter trabalho.
E como o apoio do PCP ao Governo?
O PCP foi decisivo nesta solução de Governo porque a História lembrará que, na noite das eleições, o partido socialista fez um discurso de derrota e foi só após os desafios do PCP, dizendo que o PS só não formava governo se não quisesse, que essa situação se inverteu.
Haverá momentos certamente de grande divergência entre Marcelo e o PCP e entre Marcelo e outras forças à EsquerdaNós não passámos a ser idênticos nas opções em relação ao PS, mantemos as nossas divergências e algumas são profundas em vários aspetos da vida política, mas não podíamos aceitar que continuássemos a ter um governo PSD/CDS que tinha tido minoria de votos no conjunto da eleição e que se preparava para continuar a aplicar uma política de destruição nacional. Não nos conformámos perante isso. Muitos dos ganhos que têm sido obtidos têm sido com a ação decisiva do PCP mesmo nas autarquias onde o partido tem uma reflexão e uma capacidade de proposta de grande qualidade e muito ligada às realidades locais.
Considera que Jerónimo de Sousa tem sido uma voz essencial no partido ou está na altura de uma nova liderança?
Ele tem uma voz essencial no país. É uma pessoa que é uma referência para largas camadas da população muito para além do PCP, pela justeza das posições que defende, que são do PCP, e pela forma direta, simples, mas não simplista, com que aborda diversos problemas. Julgo que para muitas pessoas ele representa o que gostariam de dizer nos sítios onde ele intervém. E isso é uma mais valia fantástica que tem a ver também com características do próprio, de humanidade, de experiência de vida, que o tornam uma personalidade ímpar no panorama político nacional e respeitado em todos os setores.
Mas eventualmente terá de ser substituído. Quem acha que está à sua altura para assumir a liderança do PCP?
Ele não precisa de ser substituído. Acabou de ser eleito em congresso para um mandato de quatro anos. Mas sim acabará por acontecer, todos nos vamos terminar os nossos mandatos.
E Marcelo Rebelo de Sousa tem tido um papel preponderante para o sucesso deste Governo?
Julgo que foi positivo que ele não tivesse obstaculizado esta opção política. Agora Marcelo Rebelo de Sousa é uma personalidade de Direita, em momentos em que é preciso ter um posicionamento político, ele tem marcado posições. Em relação à banca, as medidas negativas que o PS tomou em relação ao Banif, por exemplo, esta ideia de vender o Novo Banco, tem tido o apoio do Presidente da República.
Não há nenhuma razão hoje para não termos um comunista à frente da Câmara Municipal de LisboaNão tenho nada a criticar quanto ao estilo da sua proximidade das pessoas, isso é uma coisa positiva e não negativa, mas não deve confundir-se com as orientações políticas de um Presidente da República, que é uma coisa bem diferente. A história o dirá... como haverá momentos certamente de grande divergência com o PCP e com outras forças à Esquerda. Certamente irá acontecer.
Concorda que Marcelo tenta transmitir a ideia de que está sempre tudo bem?
Não penso que alguém, mesmo o Presidente da República, consiga esconder as coisas que estão mal quando estão mesmo mal.
Quanto às eleições à Câmara de Lisboa (CML), que análise faz, com nomes como Fernando Medina e Assunção Cristas em destaque?
Não, está enganada. Eu próprio tive a oportunidade de estar na apresentação do João Ferreira e até parece que já há outras [candidaturas]. Julgo que o João Ferreira é um dos quadros dirigentes mais destacados do PCP, tem um trabalho inigualável no Parlamento Europeu, teve um mandato de muita presença e muita participação e iniciativa política neste mandato na Câmara de Lisboa como vereador e é sem dúvida uma pessoa que tem todas as condições para ser presidente da CML.
Já ninguém quereria, nem mesmo alguns dos que o apoiaram, voltar a esse governo de destruição nacional que foi o governo PSD/CDS Ele está a destacar-se. Não há nenhuma razão hoje para não termos um comunista à frente da CML. Como o próprio João Ferreira diz: se a CDU e PCP estão em maioria nas câmaras da área metropolitana de Lisboa não há razão para isso não poder acontecer.
E de que forma é que pode marcar um papel diferente à frente desta autarquia?
Ele tem o seu programa, já apresentou algumas ideias contra uma política de especulação, que tem vindo a ser recenseada pela CDU em Lisboa. Mas eu não vou fazer o debate político por ele.
Acha que Assunção Cristas foi inteligente em candidatar-se a Lisboa?
A última experiência que o CDS teve nessa matéria foi quando o Paulo Portas se candidatou com uns cartazes em que dizia ‘Eu fico’. E não ficou. Não sei se a história se vai repetir ou não, mas penso que é uma candidatura de Direita de uma pessoa que, aliás, tem grandes responsabilidades pelas situações dramáticas que algumas pessoas vivem em Lisboa. Por exemplo, a Lei das Rendas que foi da sua responsabilidade política e que tem dificultado a vida a muitos inquilinos na cidade.
O PSD ainda não tem um candidato definido, sabendo-se que não avançará com uma coligação. Em quem acha que vai recair a escolha de Passos Coelho para este cargo?
Acho que ninguém consegue prever isso, nem o próprio. Não é uma questão de previsão, já é uma questão de encontrar alguém que queira.
E porque é que acha ninguém quer dar a cara pelo partido? Está na hora de o PSD arranjar um novo líder?
Leio os jornais e percebo que já foram feitos vários convites e que nenhum foi aceite. Não me vou pronunciar sobre a vida interna do PSD. Passos Coelho foi um primeiro-ministro que penalizou muito o nosso povo, não tem mais nada para oferecer aos portugueses na sua proposta política que não seja a continuação da política que praticou no governo e todos percebemos que a maioria dos portugueses não quer isso. Já ninguém quereria, nem mesmo alguns dos que o apoiaram, voltar a esse governo de destruição nacional que foi o governo PSD/CDS.
É preciso ter coragem para se ser comunista e felizmente há cada vez mais pessoas com essa coragem
Quanto ao seu futuro. Gostaria de voltar ao Parlamento?
Não tenho nenhuma perspetiva de outra função política que não seja a Câmara de Loures. É nisso que estou concentrado. Mas de certeza que não voltarei ao Parlamento. Já la estive 18 anos.
Chegou a dizer que era difícil ser-se comunista, porque havia muito preconceito. Isso está a mudar?
É fácil porque se dorme todos os dias tranquilamente com a consciência de dever cumprido, de defender posições justas e ter ações justas perante as pessoas. Enfrentamos uma grande incompreensão e uma barragem de comunicação negativa nos principais órgãos de comunicação social que torna muito difícil esta função. É preciso ter uma grande coragem em alguns sítios para se ser comunista. Mas não falo especificamente de mim. Um trabalhador assumir-se como comunista numa empresa que reprime os direitos dos trabalhadores é uma posição de grande coragem e isso continua a acontecer no nosso país 40 anos depois do 25 de Abril. Por isso é que digo que é preciso ter coragem para se ser comunista e felizmente há cada vez mais pessoas com essa coragem.

"Muitos pensavam que eu não deixaria cargo importante para ser autarca"

Esteve no Parlamento como deputado pelo CDU durante 18 anos. A sua carreira aqui culminou no momento em que se candidatou à Câmara Municipal de Loures. Um desafio que venceu, pondo fim a uma liderança socialista de 12 anos.

À frente da autarquia há quatro anos, Bernardino Soares anunciou recentemente a sua recandidatura e, em entrevista ao Vozes ao Minuto, falou sobre o passado e sobre os projetos que estão em cima da mesa.
Abandonou o Parlamento para se candidatar à Câmara Municipal de Loures. Com que objetivos?
Loures precisava de uma inversão grande na política municipal, tinha vindo a afundar-se ano após ano com a gestão anterior e a perder a qualidade dos seus serviços e também a sua importância no panorama autárquico, cultural, social. Julgo que essa inversão era absolutamente indispensável. Para mim foi um grande desafio, ainda por cima sendo originário aqui de Loures, de Camarate. Loures era o meu concelho.
Há uma certa ideia de mesquinhamento do trabalho do poder local e dos seus eleitos quando são os que estão mais próximos das suas populações

Revelou que esta foi uma candidatura proposta pelo seu partido. Era algo que já tinha ponderado ou foi uma surpresa?
Não foi nem deixou de ser. Estive eleito na Assembleia Municipal nos quatro anos anteriores. Não estava desligado da realidade local e da vida autárquica aqui do concelho e a dada altura considerou-se esta opção, implicando a saída do Parlamento. Ao contrário do que alguns na campanha eleitoral anterior diziam, nomeadamente que era uma aventura que não tinha consequências e que eu não sairia do Parlamento. Muito pelo contrário, o objetivo era vir para ser presidente e assim foi.
E porque é que havia pessoas que não acreditavam nisso?
Porque muitas pessoas achavam, alguns com boa fé outros com más intenções, que eu não deixaria um cargo tão importante como ser líder parlamentar no Parlamento nacional para vir a ser presidente da Câmara de Loures. Mas isso é de quem tem uma visão mesquinha e pouco abonatória para as autarquias e para a importância que a Câmara de Loures tem, que para mim é muita. Ser presidente não é de certeza menos importante do que ter sido líder parlamentar durante dez anos.
Gostei muito de ser deputado. Não tenho nem nunca terei um discurso anti-Parlamento
Acha que se menospreza o poder local?
Sim, há uma certa ideia de mesquinhamento do trabalho do poder local e dos seus eleitos quando são os que estão mais próximos das suas populações. O poder local tem sido ao longo das últimas décadas o que mais tem contribuído para a credibilidade do sistema político porque é aqui que se resolvem os problemas e que as pessoas veem as suas opções respeitadas ou não respeitadas e podem confrontar aqueles que elegeram com as suas responsabilidades. Isso traz uma grande capacidade de interação da população com o poder local e é uma grande mais valia no plano democrático.
E a nível pessoal também se sente mais realizado?
Gostei muito de ser deputado. Não tenho nem nunca terei um discurso anti-Parlamento. É também uma constante na nossa vida política ver políticos que fazem o seu discurso assente na ideia de que ‘eu não sou político, os outros é que são e são maus’. O Parlamento é muito importante pela pluralidade que tem das várias correntes políticas, é onde se decidem algumas das leis mais importantes no nosso país, onde se faz o debate político nacional. Gostei muito de ser deputado, deu-me muito gozo no contacto com as populações e no debate de questões. Gosto muitíssimo também de ser presidente da Câmara porque mantém-se o traço que trouxe de ser deputado, de uma grande proximidade com a população, aqui ainda mais por dever diário de função e pela possibilidade de me envolver num plano mais executivo de resolver problemas, organizar estruturas, e procurar repostas para as situações que aqui encontramos.
É um papel mais ativo?
Num sentido de ter mais reflexo na vida do dia a dia imediato, sim.
Chegou à liderança da Câmara para substituir o socialista Carlos Teixeira, que esteve 12 anos à frente desta autarquia. Sentiu o peso da responsabilidade?
Senti responsabilidade mas não foi por substituir o Carlos Teixeira. Foi por ser o presidente da Câmara de Loures.
Era fácil distinguir-se do seu antecessor?
Muito fácil. Porque não fiz promessas que não podia cumprir, porque introduzi uma política de rigor na gestão que nos permitiu reduzir de forma drástica a dívida a fornecedores nestes anos, porque ao contrário do que acontecia demos força à área da cultura, do desporto, à projeção do município como um município que faz coisas de qualidade, importantes e abertas a toda a população.
E foi motivo de orgulho voltar a trazer a CDU para a liderança desta autarquia?
Claro que sim. Isso foi também uma grande vitória política porque era uma câmara que há 12 anos não era governada pela CDU e passou a ser o maior município governado pela CDU no pais.
E em que estado encontrou a Câmara?
Muito mal, em vários aspetos. Primeiro, com uma dívida a fornecedores gigantesca, de 26 milhões no final de 2013. No final de 2016, ficou em cerca de três milhões. Fizemos um esforço enorme para reduzir a dívida. Mas não o fizemos diminuindo investimentos, pelo contrário, Aumentámos a atividade, melhorámos as condições dos trabalhadores e baixámos os impostos.
Outro aspeto era a desorganização da estrutura , isto é, a estrutura estava e ainda está em alguns aspetos pouco preparada para ter como primeira prioridade dar resposta às necessidades das pessoas. É para isso que nós cá estamos, os eleitos e a estrutura municipal. E estava desorganizada e cheia de injustiças. Temos vindo a tentar procurar novas e melhores formas de organização municipal tendo em vista que precisa de trabalhar para fora, para as pessoas.
Depois, o município voltou a ganhar o peso político que tem de ter no panorama político regional e nacional. Tínhamos aqui um município que não contava e passou a contar.
O poder local tem sido um grande motor do desenvolvimento e isso faz-se também atraindo investimentoHoje temos uma Câmara de Loures que é respeitada pelas outras entidades e perante a população. A Câmara deixou de ser conhecida pelos casos de acusação de promiscuidade, de dívidas, por uma gestão pouco feita à medida das necessidades imediatas dos seus protagonistas políticos. Hoje, concorde-se ou não, com as opções, com o ritmo dos investimentos, com as prioridades dadas, ninguém questiona a credibilidade do executivo municipal.
Mas como se justifica que um executivo tão questionado tenha estado 12 anos na liderança?
Quando há uma mudança, é sempre o resultado de insuficiências dos que perdem e de créditos dos que ganham. O que aconteceu ao longo destes anos foi que o PS procurou cimentar uma posição a partir do poder. Também fez algumas obras, mas com uma lógica sempre eleitoralista. Por exemplo, a maioria absoluta conseguida em 2009 foi obtida à custa de um fortíssimo investimento e endividamento da Câmara. Estivemos a pagar algumas coisas até agora, promessas, algumas devo dizer mirabolantes, que foram espalhadas por todo o concelho: o estádio municipal, o hotel na Quinta da Abelheira, o metro para Loures e para Sacavém…
Como é que reage a acusações de que há aproveitamentos económicos no poder local?
Há casos nesse sentido mas isso é uma pequena minoria do conjunto de trabalho do poder local. Acho que o poder local tem sido um grande motor do desenvolvimento e isso faz-se também atraindo investimento. O que é preciso é manter total transparência e cumprimento das regras legais e não haver regime de favorecimento. Há uma grande diferença entre encontrar soluções para os problemas das empresas e pessoas do que ter um tratamento de favor que julgo que na maioria dos casos não existe.
E durante o seu mandado nunca se sentiu visado por casos deste género?
Nem nunca nenhuma entidade nos pediu algum tipo de favorecimento acima da lei ou ao lado da lei ou qualquer coisa desse tipo. E sabem bem que não contariam com qualquer disponibilidade da nossa parte.
CDU tem todas as condições para voltar a vencer eleições em Loures

Conseguiu concretizar tudo a que se tinha comprometido nestes quatro anos?
Havia coisas que não dependiam só de nós, mas penso que olhando para o nosso programa eleitoral quase tudo está concretizado. Tem sido muito gratificante. Há matérias que nos escapam ao controlo e que não conseguimos concretizar completamente. Teremos que ter isso em conta nos próximos programas eleitorais.
Está confiante de que a CDU pode voltar a vencer estas eleições?
Tem todas as condições para isso até porque há um conjunto de projetos que foram agora lançados ou que estão a começar a ser trabalhados que só com a CDU em maioria na Câmara podem ser concretizados. Projetos como a frente ribeirinha para as populações da zona oriental, como o do Parque da Várzea, o do atendimento municipal. Estamos a trabalhar com grande entusiasmo mas ainda com obstáculos a remover.
Dizia, quando tomou posse, que o concelho tinha desaparecido. Sente que inverteu essa situação?
Completamente. Tomámos posições e elas são ouvidas. Tomámos posições sobre as águas, sobre a Valorsul, sobre a questão da Carris e elas têm estado no centro do debate público. Sobre a descentralização tomámos também posições fortes. E, portanto, Loures conta! E conta para definir a posição dos municípios, para definir o que é que em cada momento os governos e outras entidades têm de saber em relação à nossa opinião. Isso tem sido frequente.
Falava há pouco no metro em Loures, um projeto que se debate há muito tempo. 
Para quando a sua conclusão?
Temos vindo a pôr esta questão em cima da mesa no plano político e vamos continuar a fazê-lo. Penso que a questão dos transportes públicos, não só do metro, vai ser a grande questão do próximo mandato, aqui em Loures e noutros concelhos da área metropolitana de Lisboa. Estamos num momento de se tomar decisões que podem ou transformar esta área metropolitana numa organização coerente em termos de rede de transportes públicos que é o que precisamos para garantir a mobilidade das pessoas com preços acessíveis e também para potenciar a atividade económica porque a rede de transportes públicos é essencial para esta atividade e também para proteger o ambiente e reduzir o circuito de viaturas privadas.
Mas há impasses relacionados com questões económicas?
Precisamos de ver definido entre os municípios, o Governo e as empresas que trabalham nesta área dos transportes, um plano para o desenvolvimentos dos transportes, que são de uma pobreza enorme no concelho de Loures, e que garanta todas estas situações sejam sustentáveis financeiramente e que não sejam sustentáveis carregando cada vez mais nas tarifas cobradas, porque essa não é a solução. Chega a um ponto em que mais vale as pessoas irem de carro para Lisboa do que pagarem os transportes públicos e outras nem dinheiro têm para os transportes públicos.
Nó temos aqui uma freguesia - a Lousã - em que o passe para Lisboa custa 120 euros. Não é possível que isso aconteça. E outros concelhos têm problemas semelhantes. Será precis haver empresas públicas de transporte e do Governo que não queiram fazer disto um negócio cada vez mais lucrativo e que queiram fazer disto um negócio ao serviço do desenvolvimento.
Como é que tem sido o trabalho do Governo com as autarquias?
É uma relação bipolar. Houve coisas que correram melhor: foram devolvidos alguns direitos às autarquias desde a sua autonomia, que nos deixa gerir de forma mais coerente as nossas Câmaras, mas há outras coisas que continuam por resolver e julgo que a questão da descentralização que está em debate pode transformar-se num grande retrocesso para as populações e para as autarquias. Porque se se concretizar a transferência de competências, algumas não são adequadas para serem transferidas para as autarquias, e outras podem ser transferidas sem os recursos necessários. Em vez de melhorarmos o serviço à população vamos piorá-lo.
Uma das coisas que se pretende transferir é por exemplo o Parque Escolar na sua totalidade, aumentando a nossa responsabilidade e perdendo dinheiro com este acordo. Gastamos muito mais do que o Governo para assegurar a renovação destas escolas. Se há ainda o resto das escolas que não têm obras há não sei quantas décadas e se não vier o dinheiro para esse investimento, como vamos fazê-lo? Aumentando os impostos locais às populações? Mas então estamos a transferir uma responsabilidade para as câmaras e a obrigá-las a cobrar mais impostos?
A descentralização não pode ser para a redução tem até de ser para o aumento da despesa pública
Ou então a transferência de pessoal não médico e não clínico dos centros de saúde? 
Todos sabemos que faltam administrativos e operativos nos centros. E as verbas que vêm são só para os atuais efetivos? Mas esses não chegam. Quem é que vai contratar os restantes? É uma questão que está a ser debatida apenas em abstrato quase como se tivéssemos de dizer se somos a favor ou contra a descentralização. Nós somos a favor mas não de transferir competências sem recursos e de forma descoordenada. Não é descentralizar e varrer para debaixo do tapete um problema e responsabilizar as autarquias pelo mesmo.
E que vantagens há nesta descentralização?
A descentralização pode ter vantagem se se transferir para as autarquias competências que são adequadas para as mesmas, com os recursos necessários. Por exemplo, vejo que uma da propostas que lá está é a questão dos imóveis que são propriedade do Estado ou de entidades públicas e que estão devolutos . Pode ser uma boa solução desde que possam ser utilizados para a política de habitação.
É preciso ver no concreto a questão e moderar uma tendência que o Governo parece estar a ter de usar a descentralização para reduzir a despesa pública. A descentralização não pode ser para a redução tem até de ser para o aumento da despesa pública, para executar aquelas competências nós precisamos de mais recursos e não de menos.
O Presidente da República dizia que era necessário resolver esta questão antes das eleições autárquicas. Com todos estes conflitos, acha que isso vai acontecer?
É possível, o que não quer dizer que a solução seja boa. Bem sei que o Presidente da República está muito empenhado em que isto se concretize mas é preciso ver o que vem lá dentro. Não pode ser só descentralização sim ou não, isso todos dizemos que sim, mas depois a que é que isso corresponde em concreto? Até agora o Governo aprovou uma lei de bases com uma série de competências elencadas, algumas das quais não se sabe propriamente o que são e até agora não apresentou nem a lei das finanças nem os estudos que justificam a transferência dessas competências. Porque eu gostava de saber no meu concelho quanto é que o Governo gastou nos últimos 10 anos por exemplo nos centros de saúde, que é uma coisa que se pretende transferir, para fazer uma avaliação do que vai ser proposto em termos de financiamento. Mas se esses estudos não aparecem como é que vamos tomar uma decisão destas? Apenas com base na ideia de que tudo o que vier para as autarquias é uma boa descentralização? Isso não é assim.
Significa isso que não concorda com a afirmação de Marcelo Rebelo de Sousa que dizia que a descentralização era um “sonho do poder local democrático nascido em 1974”?
A descentralização sim, o que não quer dizer que esta proposta vá nesse sentido.


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