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sábado, 3 de janeiro de 2015

A birra do morto em um acto - O segredo, guardado para o fim, está em saber qual é a maior birra: se a do morto que não quer ser enterrado, se a de quantos à volta já lhe atiram pazadas em cima.

A birra do morto em um acto
Afonso Camões
A peça convoca-nos para um velório, cheiro a velas ardentes e defumadouros, caixão ao centro.
A autoria é de Vicente Sanches, o nosso maior dramaturgo vivo, um deliberadamente obscuro discípulo de Régio.
A mais profética das suas obras, "A birra do morto", é uma farsa trágica, levada à cena, em finais dos setenta, pelo saudoso Mário Viegas, no Teatro Experimental do Porto.
Aí, o personagem principal é um morto que se recusa a ser enterrado, desprezando os argumentos que lhe apresentam as personagens de primeira linha (o médico, a viúva, o dono da funerária, etc.), que já tinham organizado a vidinha contando com a sua morte.
Ao fechar do pano, é subjugado por agentes da GNR e fechado à força no caixão para que tenham lugar as cerimónias fúnebres.
O segredo, guardado para o fim, está em saber qual é a maior birra: se a do morto que não quer ser enterrado, se a de quantos à volta já lhe atiram pazadas em cima.
Concordaremos todos com o presidente Aníbal Cavaco Silva que "2015 será um ano de escolhas decisivas", com os portugueses a serem "chamados a pronunciar-se" em eleições.
Mais difícil é acordarmos na sua visão de que "a economia está a crescer, a competitividade melhorou, o investimento iniciou trajetória de recuperação, o desemprego diminuiu", só porque é da praxe que o presidente rogue por uma réstia de sol e esperança, nestes primeiros dias do novo ano.
Mas também não condescendemos na visão daqueles que antecipam, na mensagem de Belém, a imagem de um presidente a finar-se, um instrumento dócil da maioria de turno e preocupado apenas em garantir alguma imortalidade na sua página da história pátria.
Para os que lhe querem antecipar um adeus, ele previne que o tempo depois das eleições será marcado por "exigências de compromisso e diálogo".
Ou seja, estabelece o imperativo de um acordo entre os dois partidos mais votados, mesmo antes de eleições.
E, sem precisar de o dizer, o que ele nos está a comunicar, na única profecia do seu discurso, é que será ele ainda, ele e não desejados outros, quem vai - mesmo antes de lhe dar posse - condicionar a constituição de qualquer novo governo. Eis o poder de um presidente.
Morto,o quê ?

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