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quinta-feira, 24 de março de 2011

EIS O REMÉDIO !



O senhor Anacleto tem 95 anos. Foi professor e exerceu a sua profissão durante mais de 50 anos. Enviuvou há dois e desde então, de mês a mês, pontualmente como o relógio grande que antes marcava as horas na sala da sua casa, muda de uma casa para outra entre os seus cinco filhos. Recusa-se a viver num lar, não quer empregados em casa e a solução encontrada de comum acordo passa pela estada temporária em casa de cada um dos filhos. Do Algarve até ao Minho, porque nenhum vive nas ilhas, o senhor Anacleto lá vai cumprindo as suas periódicas visitas, levando consigo a mala e nesta os remédios de que necessita.
Estava há dias com uma das filhas na urgência. Uma queda na rua e algumas dores nas costas. O médico que o atende pergunta-lhe pela medicação e ouve-o sem surpresa enumerar a cor de quatro ou cinco comprimidos diferentes. Como muitos idosos (e outros nem tanto), e apesar da excelente memória, recusa-se a fixar o nome da medicação. A filha apercebe-se de que na lista parecem faltar alguns e recorda-lhe um outro branco pequenino e umas cápsulas castanhas, ao que o idoso aclara tratar-se dos medicamentos do cardiologista e esse é do consultório privado e estão num serviço público, e acrescenta haver ainda uns outros de que nem sabe cor nem formato porque lhe foram receitados há cerca de quinze dias na urgência do hospital da localidade onde estava — e a que recorrera por dor abdominal.
Bem vistas as coisas, e sem nenhum espanto para os médicos que habitualmente lidam com estes doentes, o senhor Anacleto estaria a tomar, no mínimo, entre sete a dez medicamentos, prescritos por diferentes clínicos em diferentes contextos (clínica privada, centro de saúde, urgência hospitalar), sem que nenhum soubesse dos restantes, porque a listagem total da medicação não é visível ao abrir um processo clínico informatizado, a menos que tenha sido prescrita naquela instituição ou com aquele programa. Não é também improvável que do conjunto dos vários medicamentos alguns fossem exatamente iguais aos outros, diferindo apenas na cor, no nome ou no laboratório que os produziu, com o consequente risco para a saúde do doente e aumento dos custos (imediatos — no momento da compra — e diferidos — pelas complicações que daí podem resultar) para o Serviço Nacional de Saúde.
Provável é também que alguns entre si fossem incompatíveis ou que a sua associação devesse ser criteriosamente pensada ou até excluída, pois poderiam anular ou potenciar os efeitos uns dos outros, tornando-se assim ineficazes ou, pelo contrário, com um maior efeito do que seria de esperar. Isto caso se soubesse o que o doente estava a tomar, o que na atualidade e face às presentes circunstâncias é quase totalmente impossível. Quando a necessidade de contenção de custos é notória, o envelhecimento populacional é uma realidade, a informatização do serviço público de saúde está a avançar, a informática parece encontrar uma solução para (quase) todos os problemas, não será possível encontrar um ponto comum entre os vários programas instalados e cruzar em tempo real informação vital como é a da medicação, ao menos no serviço público, melhorando a prestação de cuidados a uma população cada vez mais idosa, com mais problemas de saúde, com menos recursos económicos e, por acréscimo, à população em geral?
Acredito que ao consegui-lo, ainda que com custos imediatos muito grandes, se poupariam muitos milhões de euros inutilmente gastos na atualidade e se melhoraria em muito a saúde das populações. Era, provavelmente, ‘remédio santo’. 
Artigo da Dra. Cristina Galvão, Publicado no Expresso 12.03.2011


O senhor Anacleto tem 95 anos. Foi professor e exerceu a sua profissão durante mais de 50 anos. Enviuvou há dois e desde então, de mês a mês, pontualmente como o relógio grande que antes marcava as horas na sala da sua casa, muda de uma casa para outra entre os seus cinco filhos. Recusa-se a viver num lar, não quer empregados em casa e a solução encontrada de comum acordo passa pela estada temporária em casa de cada um dos filhos. Do Algarve até ao Minho, porque nenhum vive nas ilhas, o senhor Anacleto lá vai cumprindo as suas periódicas visitas, levando consigo a mala e nesta os remédios de que necessita.
Estava há dias com uma das filhas na urgência. Uma queda na rua e algumas dores nas costas. O médico que o atende pergunta-lhe pela medicação e ouve-o sem surpresa enumerar a cor de quatro ou cinco comprimidos diferentes. Como muitos idosos (e outros nem tanto), e apesar da excelente memória, recusa-se a fixar o nome da medicação. A filha apercebe-se de que na lista parecem faltar alguns e recorda-lhe um outro branco pequenino e umas cápsulas castanhas, ao que o idoso aclara tratar-se dos medicamentos do cardiologista e esse é do consultório privado e estão num serviço público, e acrescenta haver ainda uns outros de que nem sabe cor nem formato porque lhe foram receitados há cerca de quinze dias na urgência do hospital da localidade onde estava — e a que recorrera por dor abdominal.
Bem vistas as coisas, e sem nenhum espanto para os médicos que habitualmente lidam com estes doentes, o senhor Anacleto estaria a tomar, no mínimo, entre sete a dez medicamentos, prescritos por diferentes clínicos em diferentes contextos (clínica privada, centro de saúde, urgência hospitalar), sem que nenhum soubesse dos restantes, porque a listagem total da medicação não é visível ao abrir um processo clínico informatizado, a menos que tenha sido prescrita naquela instituição ou com aquele programa. Não é também improvável que do conjunto dos vários medicamentos alguns fossem exatamente iguais aos outros, diferindo apenas na cor, no nome ou no laboratório que os produziu, com o consequente risco para a saúde do doente e aumento dos custos (imediatos — no momento da compra — e diferidos — pelas complicações que daí podem resultar) para o Serviço Nacional de Saúde.
Provável é também que alguns entre si fossem incompatíveis ou que a sua associação devesse ser criteriosamente pensada ou até excluída, pois poderiam anular ou potenciar os efeitos uns dos outros, tornando-se assim ineficazes ou, pelo contrário, com um maior efeito do que seria de esperar. Isto caso se soubesse o que o doente estava a tomar, o que na atualidade e face às presentes circunstâncias é quase totalmente impossível. Quando a necessidade de contenção de custos é notória, o envelhecimento populacional é uma realidade, a informatização do serviço público de saúde está a avançar, a informática parece encontrar uma solução para (quase) todos os problemas, não será possível encontrar um ponto comum entre os vários programas instalados e cruzar em tempo real informação vital como é a da medicação, ao menos no serviço público, melhorando a prestação de cuidados a uma população cada vez mais idosa, com mais problemas de saúde, com menos recursos económicos e, por acréscimo, à população em geral?
Acredito que ao consegui-lo, ainda que com custos imediatos muito grandes, se poupariam muitos milhões de euros inutilmente gastos na atualidade e se melhoraria em muito a saúde das populações. Era, provavelmente, ‘remédio santo’. 
Artigo da Dra. Cristina Galvão, Publicado no Expresso 12.03.2011
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