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domingo, 17 de julho de 2016

NO CORAÇÃO DAS TREVAS, AS GRANDES INSTITUIÇÕES INTERNACIONAIS, E NÓS À PROCURA DA LUZ AO FUNDO DO TÚNEL COMO SAÍDA PARA A CRISE? IMPOSSÍVEL – 6. O NEOLIBERALISMO, TERÁ ELE SIDO SOBREVALORIZADO? – por JONATHAN D. OSTRY, PRAKASH LOUNGANI e DAVIDE FURCERI – II


By joaompmachado / 17 de Julho de 2016 / Economia, Finanças, Política



Uma série sobre o caminho da agonia do capitalismo


CHILE




O neoliberalismo, terá ele sido sobrevalorizado?



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Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani, and Davide Furceri, Neoliberalism: Oversold?

International Monetary Fund, Finance & Development, June 2016, Vol. 53, No. 2

(CONCLUSÃO)



A dimensão do Estado

Reduzir o tamanho do Estado é outro objectivo da agenda neoliberal. A privatização de certas missões  governamentais é uma maneira de atingir este objectivo. O outro objectivo é o  de  limitar as despesas públicas do governo através da redução dos défices orçamentais e de limitar  a capacidade dos governos para se endividarem . E a  história económica nas últimas décadas oferece muitos exemplos de tais restrições, como o limite da  dívida em 60% do PIB, imposto aos países que querem aderir à zona euro (que é um dos critérios de Maastricht).

A teoria económica dá pouca indicação quanto ao  nível ideal da dívida pública. Algumas teorias justificam níveis mais elevados de dívida ( uma vez  que a tributação cria  distorções ) e outros preferem níveis inferiores  e mesmo negativos (pois que os choques adversos apelam à  existência de poupança de precaução). Nalgumas das recomendações de política orçamental, o FMI preocupa-se especialmente sobre a velocidade a que os governos reduzem os seus défices  e os seus níveis de endividamento na   sequência da  acumulação de dívida nas economias avançadas induzida pela crise financeira global.  Um desendividamento  muito lento perturba os  mercados. Um desendividamento rápido demais   pode inviabilizar a retoma da economia.  Mas o FMI também defendeu os reembolsos parciais a médio prazo em muitos países desenvolvidos e emergentes, principalmente para evitar novos choques…

Existem boas razões, para países como a Alemanha, o Reino Unido ou os EUA  quererem reduzir a  sua dívida pública? Dois argumentos jogam a favor do  reembolso da dívida em países com uma larga base fiscal  e onde o risco de crise financeira é baixo. O primeiro argumento é que, embora as recessões grandes tais como a Grande Depressão dos anos 1930 ou a crise financeira mundial da última década sejam  raras, é útil, para quando estas ocorrem, terem-se  aproveitado os períodos faustos para reembolsar a dívida. O segundo argumento baseia-se na ideia de que a dívida elevada é uma coisa má   para o crescimento e que, portanto, é essencial  reduzir a dívida para criar uma base sólida para promover o crescimento .

É verdade que muitos países (como os países do Sul da Europa) devem praticar a consolidação orçamental, especialmente porque os mercados não lhes permitirão continuarem  a endividarem-se se assim não fizerem. No entanto,  a necessidade de “austeridade” em alguns países, não significa que esta seja uma necessidade em todos eles. Assim, a circunspecção face à aplicação de uma política única para todos é plenamente justificada.  Os mercados geralmente imputam uma  muito baixa probabilidade de crise da dívida em países que têm uma forte reputação de responsabilidade financeira (Mendoza e Ostry, 2007). Uma tal  reputação dá-lhes  a latitude para decidir não aumentar os impostos ou para não reduzir as despesas produtivas, quando o nível de endividamento é alto (Ostry et al., 2010;) Gosh e outros, 2013). E para os países com fortes antecedentes, o benefício de uma redução da dívida para evitar uma crise financeira futura prova-se ser  excepcionalmente baixo, mesmo se os seus níveis de dívida são altos. Por exemplo, movendo-se de um rácio da dívida de 120 por cento do PIB para 100% do PIB durante alguns  anos permite apenas uma pequena redução do risco de crise para os países (Baldacci et al., 2011).

Mas mesmo que o benefício seja baixo, isso, no entanto, poderia  ser útil se o custo também for  baixo. Acontece  que o custo pode ser significativo – muito mais do que o benefício obtido.  A razão é que, para chegar a um nível de endividamento mais baixo, os impostos devem ser aumentados temporariamente ou as despesas públicas serem reduzidas e às vezes ambas as coisas ao mesmo tempo. Os custos  do aumento de  impostos ou dos cortes nas despesas necessárias para o desendividamento podem ser muito maiores do que a diminuição do risco  de crise  permitido pela redução da dívida (Ostry, Gosh e Espinoza, 2015). Isso não significa que se deva considerar que   uma dívida alta não tem nenhuma incidência sobre o crescimento e sobre o bem-estar. Claro, isso tem desvantagens. Mas a questão essencial reside na ideia de que o custo de uma dívida mais elevada (o chamado fardo da dívida) é o que já ocorreu e que já não pode ser recuperado. É um custo irrecuperável.

Confrontados  com a escolha de viver com uma dívida elevada  – deixando que a redução da dívida seja feita organicamente pelo   crescimento – ou então utilizar deliberadamente os  excedentes orçamentais para a redução da dívida, os  governos com  uma larga base de impostos fariam  melhor em  aceitar   viver com a sua dívida. Porque as políticas de austeridade tem custos sociais significativos, degradam o  emprego  e agravam o desemprego.

A ideia que a consolidação orçamental possa gerar  crescimento (ou seja aumentar a produção e o volume de emprego), aumentando a confiança do sector privado e o investimento, foi defendida nomeadamente pelo economista de Harvard Alberto Alesina no mundo universitário e pelo antigo presidente do Banco central europeu Jean-Claude Trichet na arena política. Contudo, na prática, os episódios de consolidação orçamental foram mais seguidos por períodos de fraco que de forte crescimento. Em média, uma redução da dívida de 1% do PIB aumenta a taxa de desemprego a longo prazo de 0,6% e as desigualdades de rendimentos medidas pelo coeficiente de Gini em  1,5% (Baile e outro, 2013).

Em suma, as vantagens das políticas neoliberais  parecem ter sido um pouco  exageradas. No caso da abertura financeira, certos fluxos de capitais, tal como o investimento directo estrangeiro, parecem gerar  as vantagens esperadas. Mas  com outros fluxos, em especial os fluxos de capitais de  curto prazo, os benefícios sobre o crescimento são difíceis de obter, enquanto que os riscos em termos de volatilidade e o  risco acrescido de crise  estão muito presentes. No caso do saneamento orçamental, os custos a curto prazo devidos à baixa da produção, à diminuição do bem-estar e ao aumento do desemprego foram minimizados. E subestimou-se a possibilidade de manter  rácios de dívida elevados se a base fiscal o permitir,  porque esta dívida reduzir-se-á de ele mesma com o crescimento.

Um efeito desfavorável

Por outro lado, como a abertura internacional e a austeridade estão associados a uma crescente desigualdade de rendimento, isto induz um efeito de arrasto  negativo. O aumento da desigualdade resultante da austeridade e da abertura financeira poderia travar este crescimento e quando este é o verdadeiro objectivo que o neoliberalismo pretende precisamente  estimular. No entanto há agora provas sólidas de que a desigualdade pode diminuir  e em simultâneo tanto o nível como a solidez do crescimento  (Ostry, Berg e Tsangarides,) 2014.

A prova dos danos económicos criados pela desigualdade sugere que aqueles que decidem das políticas económicas a serem praticadas  deveriam estar  mais abertos à  redistribuição do rendimento  do que têm estado até agora. Claro, além da redistribuição, as políticas poderiam ser projectadas para atenuarem  alguns dos efeitos negativos gerados a montante como,  por exemplo, através do aumento das despesas na educação e de  formação que, por sua vez, aumentam a igualdade de oportunidades antecipadamente pelos seus próprios   impactos (a isto chamam-se condições de pré-distribuição). Enquanto isso, a consolidação orçamental, quando é  necessária, poderia ser projectada para minimizar o impacto negativo sobre os rendimentos mais baixos. Por outro lado, em certos casos, os efeitos adversos da desigualdade devem ser corrigidos logo que apareçam  usando os impostos  e as despesas  públicas   para redistribuir a riqueza. Por sorte,  o medo de que tais políticas possam em si-mesmas  prejudicar o crescimento é sem fundamento (Ostry, 2014).

Encontrar o equilíbrio

Tudo isto sugere a necessidade de sermos mais cuidadosos na quantificação dos benefícios do neoliberalismo. O FMI, que supervisiona o sistema monetário internacional, tem estado na vanguarda desta revisão. Por exemplo, o antigo chefe economista Olivier Blanchard tem declarado desde  2010: “um saneamento e  uma credível consolidação orçamental de médio prazo são uma necessidade  em muitas economias avançadas, mas não o seu estrangulamento actual. Três anos mais tarde, o director geral do FMI Christine Lagarde, disse que o Congresso dos EUA tinha razão em  aumentar o tecto da dívida do país “porque não se deve contrair  a economia, reduzindo  acentuadamente  as despesas públicas  enquanto que a economia está a recuperar “. Em 2015, enfim,  o FMI indicou que os países da zona euro “que têm margem de manobra orçamental  devem utilizá-la  para apoiar o investimento”.

A opinião do FMI  também mudou quanto à sua concepção dos efeitos da liberalização do capital – passou-se de uma hostilidade inicial a uma melhor aceitação dos controles sobre os movimentos de capitais para lidar com a volatilidade dos fluxos de capital. O FMI reconhece que a liberalização total dos fluxos de capital não é sempre um objectivo  final adequado e que uma liberalização continuada  não é benéfica  e é mesmo um  pouco arriscada a menos que os  países tenham atingido certos limiares de desenvolvimento financeiro e institucional.

A  experiência pioneira do Chile com o neoliberalismo recebeu então os elogios do Prémio Nobel Milton Friedman, mas muitos economistas defendem hoje uma  perspectiva  mais matizada como a que apresenta o Professor Joseph Stiglitz (ele mesmo um prémio Nobel), a de que o Chile “é um exemplo de sucesso da articulação  dos mercados com uma regulamentação apropriada (2002). Stiglitz observou que, nos primeiros anos da  sua marcha para o neoliberalismo, o Chile impôs  “controlos sobre os fluxos de capital, a fim de não ser por eles inundado”, como aconteceu uma década e meia mais tarde no primeiro país da crise asiática, a Tailândia. A experiência chilena e outras mais sugerem que nenhuma agenda rígida proporciona  bons resultados em todos os momentos e em todos os lugares. Os decisores das políticas económicas que têm vindo a ser aplicadas e as Instituições que os aconselham como o FMI, devem ser  guiados  não pela  ideologia, mas pelas provas tangíveis  do que realmente funciona.

Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani, and Davide Furceri, Neoliberalism: Oversold?,  Finance & Development,  June 2016, Vol. 53, No. 2. Texto disponível em:

http://www.imf.org/external/pubs/ft/fandd/2016/06/ostry.htm

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