O fado descende directamente do romanceiro, o canto narrativo tradiconal , cuja origem remonta à Idade Média. É, pelo menos, a convicção do investigador José Alberto Sardinha, plasmada no livro "A origem do fado", resultado de 20 anos de investigação.
Em "A origem do fado", José Aberto Sardinha contraria tudo o que até hoje se escreveu sobre a matéria. Que a história da chamada canção de Lisboa sempre andou envolta em mistério e que o género terá sofrido influências do Brasil, de África e do Médio Oriente era o que até agora se sabia. Mas, na investigação de José Alberto Sardinha, todas estas teorias são postas de parte. Para o autor, o fado não é só de Lisboa porque, explica com ironia, "nunca existiu à entrada de Lisboa uma alfândega musical que determinasse que dali nem saía o fado nem entravam chulas e malhões. Para mim, o fado tem a sua génese no romanceiro tradicional".
O investigador defende ainda a ideia de que o fado não nasceu nas tabernas, mas, sim, na rua e nas feiras. "Há 35 anos que sou investigador da música de tradição oral no campo. E, como tal, o fado não ocupava as minhas preocupações. Também eu partia do preconceito que toda a gente tem de que o fado é uma canção de Lisboa e que, portanto, não tem nada a ver com o campo".
Apesar de tudo, sublinha, "nessas minhas investigações no terreno, ia gravando alguns fados bailados, que apareciam sempre. Claro que, na altura, levava isso sempre à conta de que seriam importações do campo em relação à cidade. Mas, o que é verdade é que sempre notei que havia um certo género poético musical muito semelhante ao fado, em termos melódicos e na própria entoação".
Rural versus urbano
O investigador explica que essas semelhanças entroncam no romanceiro tradicional. "O romanceiro tem a sua origem nas gestas em que se narravam histórias da guerra contra os mouros e que, a partir do século XVI, começou a contar histórias de amores e desamores de reis e de rainhas e que mais tarde, no século XVII, passou a contar histórias do dia a dia de gente simples. Todo esse reportório foi, durante séculos, cantado por músicos ambulantes, os jograis, e, posteriormente, pelos ceguinhos".
O ponto de viragem na investigação de José Alberto Sardinha aconteceu em 1988. "Um dia, depois de gravar uma velhota durante uma tarde inteira a cantar romanceiros, percebi que havia pontos de contacto com o fado. Voltei para casa, voltei a ouvir gravações antigas que fizera e pensei: "se substituirmos o conceito de semelhança pelo conceito de identidade, pode ser uma revolução. E, então, investiguei mais profundamente nos anos seguintes".
"Ao longo de 22 anos", conta José Alberto Sardinha, "comecei a direccionar a minha investigação na procura dos ceguinhos, na gravação do seu reportório, na gravação de romances e na busca da génese do fado. E é isso que dá origem a este volume, que é sutentado por quatro CDs. No fundo, o que defendo é que, do século XVI até princípios século XX, Lisboa comungava de um mesmo substracto cultural com as aldeias, vilas e cidades do resto do país. Isto é, havia uma realidade, uma prática e uma vivência musicais que eram comuns".
José Alberto Sardinha também avança outra teoria para a origem da palavra "fado". De acordo com o investigador, a palavra, ao nível popular, tem o sentido de vida. "Portanto", defende, "o fado chama-se fado porque conta histórias".
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