Após 48 anos de ditadura respirou-se Liberdade em Portugal.
Há 44 anos saiam à rua os militares, os cravos e o Povo. Os cidadãos passaram a poder pertencer a um partido político, um sindicato ou a uma associação cultural em pleno.
Acabou a guerra colonial que ceifou mais de oito mil vidas na sua juventude e provocou milhares de feridos, que ainda hoje se sentam nas nossas mesas afectados por uma guerra à qual não pertenciam.
A PIDE foi extinta. Foram libertados os presos políticos e os portugueses exilados regressaram ao seu país.
Há 44 anos conquistámos a liberdade de expressão, o direito à manifestação, o direito à greve. Os trabalhadores e as classes desfavorecidas passaram a ter o direito à habitação, à saúde, à educação, a ter férias, ao décimo terceiro mês e a um salário mínimo.
Assim se garantiam mais oportunidades, qualidade de vida a uma esmagadora maioria da população.
“Isto vai meus amigos, isto vai
um passo atrás são sempre dois em frente
e um povo verdadeiro não se trai
não quer gente mais gente que outra gente”
Isto vai, mesmo com os passos atrás com um sem número de trabalhadores precários nos privados e no público, com uma juventude sem perspectiva de futuro de formar família ou de conseguir um tecto, mesmo com o mistério em que se transformou o dia de amanhã.
“Isto vai meus amigos, isto vai
o que é preciso é ter sempre presente
que o presente é um tempo que se vai
e o futuro é o tempo resistente”
Isto vai, mesmo quando em 2018 ainda temos crianças a estudar debaixo de telhados de amianto, e o Estado dá o mau exemplo de ter funcionários públicos debaixo deste inimigo da saúde pública.
Mesmo quando os rios e as ribeiras continuam a correr coloridos, quais invejosos da sorte e beleza do arco-íris. Mesmo que alguns insistem em privatizar a água, para que deixe de ser um direito de todos. Mesmo que se continue a não olhar para a educação como a solução para o futuro do país, mantendo-se em Portugal 500 mil pessoas que não sabem ler nem escrever, das quais 130 mil com idades entre os 15 e 65 anos.
Isto vai meus amigos, isto vai…
Mesmo que, a partir da mentira, se despejem bombas ontem na Jugoslávia, depois do Iraque, hoje na Síria, com o cortejo de destruição e morte e que o Governo Português não respeite a Constituição e apoie a Guerra em vez de defender a paz, como previsto no seu artigo 7º.
Mas
“Depois da tempestade há a bonança
que é verde como a cor que tem a esperança
quando a água de Abril sobre nós cai.”
O verde da esperança de vivermos num país ou numa cidade que respeita todos de igual forma, onde a democracia prevalece e que não afasta a população dos grandes momentos de decisão e de mudanças.
De assegurarmos o direito ao acesso à saúde, à educação, à justiça, à cultura, aos serviços públicos, à mobilidade, pois o mais importante é assegurar a felicidade do nosso povo.
O verde da esperança de vivermos numa sociedade em que a mulher tem lugar ao lado do homem em todos os patamares da sociedade. Salários iguais, direitos laborais iguais, participação igual, sem muros nem ameias para alguns! Sobretudo, esperança que os números de violência doméstica não sejam iguais aos de 2017 em que 18 mulheres foram assassinadas e 23 foram vítimas de tentativa de homicídio.
Isto vai, meus amigos, isto vai…
Mesmo com as certezas que todos os dias nos são reveladas pela dura, nua e crua realidade de um Mundo cada vez mais perigoso, com o sistema capitalista a evidenciar a sua natureza mais negra.
Um Mundo dos senhores da Guerra, do roubo de recursos naturais e da exploração,
onde 82% da riqueza criada em 2017 ficou nas mãos dos 1% mais ricos;
onde 42 pessoas acumularão a mesma riqueza que as cerca de 3,7 mil milhões de pessoas mais pobres;
onde mais de 3 milhões de crianças com menos de 5 anos morrem subnutridas todos os anos;
onde existem mais de 192 milhões de trabalhadores desempregados e 42% dos trabalhadores têm formas de emprego precárias;
onde mais de 114 milhões de trabalhadores vivem em pobreza extrema;
onde 152 milhões de crianças são sujeitas a formas de trabalho infantil;
onde mais de 40 milhões de pessoas são vítimas de escravidão.
Este é, infelizmente, o Mundo de hoje.
Mas hoje, felizmente, 44 anos depois da Liberdade, e de muitas outras conquistas alcançadas num empolgante processo revolucionário, aquelas que não foram ainda destruídas, são naturais para todos, como o ar que respiramos.
A Liberdade, a Paz, a saúde, a educação, a protecção social, o direito a ter direitos. Mas é bom pensar que para se alcançar a “Madrugada que se esperava”, o tal “dia inicial inteiro e limpo” de que falava Sofia, foi preciso que houvesse sempre alguém que não deixasse cair a bandeira e gritasse, como dizia Jorge Sena:
“não hei-de morrer sem saber qual a cor da liberdade.”
Isto vai, meus amigos, isto vai… haverá sempre alguém que acredita que não existem derrotas eternas e que nem tudo esteve ou está perdido para sempre.
Hoje, mais do que nunca, é necessário continuar a dizer que também não há vitórias garantidas para sempre. E é por isso que continuamos na luta e afirmamos, 44 anos depois de Abril,
“O que é preciso é termos confiança
se fizermos de Maio a nossa lança
isto vai meus amigos isto vai.”
Abril, sempre!!!