De manhã, ao fazer a barba o demagogo pensou: «Espelho meu! Existe populista mais populista do que eu?». E logo começou a congeminar a malfeitoria quotidiana contra o seu ódiozinhos de estimação, esse rival que, com as suas políticas acertadas e os resultados correspondentes, punha em risco a superioridade dos favores do povo.
É que lá viria o dia em que algum daqueles com quem se esforçava por multiplicar selfies e abraços lhe perguntaria o que realmente fizera em seu favor, se nenhuma lei, nenhum projeto, nenhuma coisa concreta se lhe devia em tantos anos de vã glória de se ter como servidor do interesse público. Sim que diria? Como contrariar a ideia de que o outro é que melhorava a vida das pessoas e ele apenas se lhe impunha no palco como compère de uma representação, que só lhe atribuía papel secundário?
A ideia luziu-se de repente. Aonde é que hoje posso ser apanhado por câmaras de televisão? Onde replicar o número, sempre de sucesso garantido, de aparecer inesperadamente? E foi assim que, consolado com a ideia luminosa, desceu para o pequeno-almoço com o projeto de ir ao CCB, ao encontro das multidões melómanas junto das quais poderia replicar, uma vez mais, a sua habitual desfaçatez.
À noite, nas televisões, não faltaram notícias sobre um novo banho de multidão junto de gente sorridente e obsequiosa com a oportunidade de recolher um momento de fama.
A bebericar o cházinho de camomila a tia Genoveva ficou comovida: este senhor é um querido!
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