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quinta-feira, 28 de maio de 2015

Gostei de ler: "Sabe o peso da canga que leva ao pescoço?"

Gostei de ler: "Sabe o peso da canga que leva ao pescoço?"


A fotografia é esta. Diz-se que a dívida pública portuguesa é de 226 mil milhões de euros. Mas, se considerarmos as empresas públicas que não são incluídas no critério de Maastricht, esta dívida passa para 289 mil milhões, ou 166% do PIB. E se considerarmos toda a dívida de toda a economia portuguesa então são 702 mil milhões, contas de Março, ou 404% do PIB, quatro anos do produto total do país. Se esta dívida fosse da responsabilidade de todos, desde as crianças recém-nascidas até aos reformados, cada um deveria algo mais do que 70 mil euros (se recair só sobre a população activa e dispensar as crianças e reformados, conte, cara leitora ou leitor ainda em idade de trabalho, que a “sua” dívida andará pelos 140 mil euros).
Também há, do outro lado, créditos da economia portuguesa na balança, ou seja dívida do estrangeiro a empresas e agentes residentes em Portugal, mas a conta fala por si e é muito negativa para Portugal. Somos um país mais endividado do que a Grécia.
Tudo isto tem sido muito discutido. No entanto, há um aspecto que tem sido secundarizado e que foi o tema de uma investigação recente do Economist, que levou João Silvestre, do Expresso, a procurar os dados portugueses: quanto é que o Estado paga de juros em cada ano e que parte dessa conta é o juro pago em substituição das empresas e dos compradores de casas que têm hipotecas?
A primeira pergunta é a mais fácil de responder. O Estado paga directamente 8,8 mil milhões em juros da dívida pública (o que subestima o valor total, porque há ainda o que pagam as empresas públicas que não são registadas na dívida directa do Estado).
Mas a segunda pergunta é mais difícil: o Estado abate nos impostos a receber uma parte dos juros que as famílias pagam aos bancos pela compra de casa e abate ainda uma parte dos juros que as empresas pagam. Assim, recebe menos IRS e menos IRC porque perdoa uma parte destes impostos. No primeiro caso, a diferença é qualquer coisa como 400 a 500 milhões de euros e, no segundo, entre 740 e 1250 milhões. No total, o Estado paga em juros das pessoas e das empresas cerca de 1% do PIB total.
Somadas todas as parcelas, contabiliza o Expresso que, entre 2005 e 2014, o Estado pagou entre 72,6 mil milhões e 77,5 mil milhões de euros em juros. Não fica longe das receitas fiscais de dois Orçamentos de Estado. Ou seja, em dez anos o Estado dedicou dois anos das suas receitas ao pagamento de juros, incluindo os das famílias e das empresas que não são sua responsabilidade directa.
No caso dos Estados Unidos ou de outros países do euro, a conta é ainda maior e anda pelos 2% do PIB. Isso cria problemas difíceis: em 2007 a Grã-Bretanha gastava mais em juros do que em defesa, mesmo que tenha um dos maiores exércitos do mundo. Resolveu o assunto terminando com o desconto fiscal dos juros hipotecários.
Quando vemos o detalhe das contas, que está disponível para outros países mas não para Portugal, descobre-se que esta gestão da dívida tem duas consequências negativas. A primeira é que acentua a desigualdade (nos EUA, 90% dos benefícios fiscais em juros de crédito à habitação vão para famílias que têm rendimentos superiores ao equivalente a 70 mil euros por ano). Os mais ricos ganham mais com as vantagens fiscais. A segunda desvantagem é que estes benefícios favorecem uma economia de dívida, estimulada pelo sistema financeiro: desta forma, os bancos podem aumentar o crédito e as casas são mais caras graças a este sistema de perdas fiscais para o Estado.
Mas tudo isto tem também um custo, que é a fragilidade acrescida do sistema financeiro, em particular dada a sua densíssima interconexão. Exemplo do Economist: o crash financeiro de 2000–2002, a bolha das dot-com, as empresas de comunicação e informação, custou quatro triliões de dólares aos accionistas e não houve efeitos sistémicos, quem perdeu, perdeu; mas o crash de 2007–2008 com a bolha do imobiliário nos EUA custou metade, dois triliões de dólares, e mesmo assim desencadeou um colapso financeiro e uma recessão mundial. Um abalo numa pequena parte da dívida hipotecária propagou-se a todo o sistema financeiro e levou ao congelamento dos mercados monetários e do crédito inter-bancário. Não estamos livres de que volte a acontecer uma coisa parecida.
A economia da dívida é um barril de pólvora e favorecer o crescimento da dívida tem sido um erro. Vamos todos pagar por ele.»
– Francisco Louçã, no TME.


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