Johann Georg Elser, o carpinteiro alemão que quase conseguiu matar Hitler
Nove de novembro é muitas vezes considerado uma data decisiva na história alemã. A primeira república alemã foi proclamada em Berlim em 9 de novembro de 1918. Em 9 de novembro de 1923, Adolf Hitler tentou derrubar o governo alemão em Munique. Em 9 de novembro de 1938, as empresas judaicas e as sinagogas em toda a Alemanha foram incendiadas durante o pogrom nacional conhecido como a Noite dos Vidros Quebrados. E, em 9 de novembro de 1989, o Muro de Berlim caiu. Uma data fatídica? Talvez, mas definitivamente uma data que carrega o peso da história.
Mas é o dia anterior - 08 de novembro – que nos mostra como pode ser trágica a soma da coincidência, da natureza e da atividade humana. De fato, se o mundo não tivesse perdido 13 minutos na noite de 08 de novembro de 1939, toda uma série de sinistras datas posteriores da história alemã nunca teriam ocorrido. Mesmo a queda do Muro de Berlim nunca teria acontecido. Na verdade, o Muro nem mesmo teria sido construído.
Aqueles 13 minutos em 08 de novembro de 1939 foram o mais caros da história do século XX. Dentro de um período de menos de seis anos, de 1939 a 1945, eles custaram à humanidade 50 milhões de vidas. Para os alemães, aqueles 13 minutos resultaram em expulsões no pós-guerra da Polônia e da Tchecoslováquia e em uma nação arrasada e dividida pelos vencedores do conflito.
O aeroporto de Munique foi fechado em 8 de novembro de 1939 por causa de uma forte neblina. Como resultado, o visitante mais importante da cidade naquele dia, foi forçado a cancelar seu voo para Berlim e voltou para a capital alemã de trem. Adolf Hitler, que, a 1 de Setembro de 1939, ordenara aWehrmacht alemã a atacar a Polônia, desencadeando a Segunda Guerra Mundial, tinha chegado a Munique para dar uma palestra no salão de uma cervejaria chamada Bürgerbräukeller, tal como tinha feito em todos os 08 de novembro em anos anteriores. Era onde os membros fundadores do partido nazista se confraternizavam todos os anos para celebrar a tentativa de golpe de 08 de novembro de 1923. Um golpe que terminou com Adolf Hitler na prisão.
Por causa da neblina em Munique, Hitler começou seu discurso às 8:00 horas, 30 minutos mais cedo do que o planejado, de modo a não perder o trem noturno para Berlim. O Führer deixou a Bürgerbräukeller às 9:07 da noite. Como já dito, o mau tempo salvou a vida do ditador. Uma bomba escondida em uma coluna diretamente atrás de onde Hitler estava falando explodiria as 9:20. A explosão foi tão forte que parte do teto desabou. Oito pessoas foram mortas e 63 feridas, algumas em estado grave. Quando a bomba explodiu, Hitler já estava sentado em uma limusine aquecida, em seu caminho para a estação de trem.
Naturalmente, ninguém sabe como a história alemã teria progredido se Hitler tivesse sido assassinado no outono de 1939. A II Guerra Mundial já estava em andamento, não no Ocidente, mas no Oriente, onde o exército alemão já havia ocupado a Polônia. Será que a morte de Hitler levaria a Wehrmacht a se retirar do território ocupado de imediato? Quanto tempo teria levado para a Alemanha derrubar o regime nazista e introduzir a democracia?
Com a morte de Hitler seria improvável que uma conflagração mundial que reivindicou 50 milhões de vidas tivesse se seguido. Se pudéssemos de alguma forma ter salvo aqueles 13 minutos em novembro de 1939, todas as nossas vidas, especialmente as de nossos pais e avós e seus contemporâneos na Europa, teria sido mais tranquila. É difícil imaginar o Holocausto sem Hitler. Após sua morte,Auschwitz provavelmente teria permanecido como apenas outra pequena cidade anônima em terras da Europa Central. Talvez ela ficasse conhecida por sua fábrica, na entrada para a cidade, mas o nome Auschwitz certamente nunca teria se tornado sinônimo de horror e tampouco associado com a matança metódica de milhares de homens, mulheres e crianças inocentes. E a Alemanha de hoje, com certeza seria completamente diferente.
Sexta-feira, 3 de outubro de 2008, um homem olha para a fotografia de Johann Georg Elser, em um monumento em Freiburg, na Alemanha. Elser, um cidadão alemão, tentou assassinar Adolf Hitler com uma bomba, o atentado aconteceu em 8 de novembro de 1939. Hitler terminou seu discurso inicial, escapando da explosão cronometrada por apenas 13 minutos. Oito pessoas morreram, 63 ficaram feridas, Elser foi capturado e preso. Pouco antes do fim da II Guerra Mundial, ele foi executado no campo de concentração nazista em Dachau.
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Aqueles 13 minutos em 08 de novembro de 1939 foram o mais caros da história do século XX. Dentro de um período de menos de seis anos, de 1939 a 1945, eles custaram à humanidade 50 milhões de vidas. Para os alemães, aqueles 13 minutos resultaram em expulsões no pós-guerra da Polônia e da Tchecoslováquia e em uma nação arrasada e dividida pelos vencedores do conflito.
O aeroporto de Munique foi fechado em 8 de novembro de 1939 por causa de uma forte neblina. Como resultado, o visitante mais importante da cidade naquele dia, foi forçado a cancelar seu voo para Berlim e voltou para a capital alemã de trem. Adolf Hitler, que, a 1 de Setembro de 1939, ordenara aWehrmacht alemã a atacar a Polônia, desencadeando a Segunda Guerra Mundial, tinha chegado a Munique para dar uma palestra no salão de uma cervejaria chamada Bürgerbräukeller, tal como tinha feito em todos os 08 de novembro em anos anteriores. Era onde os membros fundadores do partido nazista se confraternizavam todos os anos para celebrar a tentativa de golpe de 08 de novembro de 1923. Um golpe que terminou com Adolf Hitler na prisão.
Adolf Hitler, aos 35 anos de idade, em sua libertação da prisão Landesberg, em 20 de dezembro de 1924. Hitler havia sido condenado por traição por seu papel em uma tentativa de golpe em 1923 chamado Putsch da Cervejaria. Esta fotografia foi tirada pouco depois dele ter terminado de ditar "Mein Kampf" ao deputado Rudolf Hess. Oito anos mais tarde, Hitler seria empossado como Chanceler da Alemanha, em 1933.
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Por causa da neblina em Munique, Hitler começou seu discurso às 8:00 horas, 30 minutos mais cedo do que o planejado, de modo a não perder o trem noturno para Berlim. O Führer deixou a Bürgerbräukeller às 9:07 da noite. Como já dito, o mau tempo salvou a vida do ditador. Uma bomba escondida em uma coluna diretamente atrás de onde Hitler estava falando explodiria as 9:20. A explosão foi tão forte que parte do teto desabou. Oito pessoas foram mortas e 63 feridas, algumas em estado grave. Quando a bomba explodiu, Hitler já estava sentado em uma limusine aquecida, em seu caminho para a estação de trem.
Naturalmente, ninguém sabe como a história alemã teria progredido se Hitler tivesse sido assassinado no outono de 1939. A II Guerra Mundial já estava em andamento, não no Ocidente, mas no Oriente, onde o exército alemão já havia ocupado a Polônia. Será que a morte de Hitler levaria a Wehrmacht a se retirar do território ocupado de imediato? Quanto tempo teria levado para a Alemanha derrubar o regime nazista e introduzir a democracia?
Com a morte de Hitler seria improvável que uma conflagração mundial que reivindicou 50 milhões de vidas tivesse se seguido. Se pudéssemos de alguma forma ter salvo aqueles 13 minutos em novembro de 1939, todas as nossas vidas, especialmente as de nossos pais e avós e seus contemporâneos na Europa, teria sido mais tranquila. É difícil imaginar o Holocausto sem Hitler. Após sua morte,Auschwitz provavelmente teria permanecido como apenas outra pequena cidade anônima em terras da Europa Central. Talvez ela ficasse conhecida por sua fábrica, na entrada para a cidade, mas o nome Auschwitz certamente nunca teria se tornado sinônimo de horror e tampouco associado com a matança metódica de milhares de homens, mulheres e crianças inocentes. E a Alemanha de hoje, com certeza seria completamente diferente.
Às 20:45, cerca de meia hora antes da bomba ser detonada, um homem de 36 anos foi preso em Constança, na fronteira alemã com a Suíça, enquanto tentava convencer os guardas de fronteira e os funcionários aduaneiros a deixá-lo entrar no país vizinho. No começo, os policiais pensaram que o sujeito fosse um traficante. Mas ele não carregava cigarros, salsichas ou bebidas alcoólicas. Em vez disso, os guardas encontraram notas sobre como fazer explosivos, um cartão postal que descrevia a Bürgerbräukeller, um emblema do grupo Frente Vermelha de Lutadores, um alicate e algumas partes de metal de aparência suspeita. Os funcionários da fronteira não sabiam o que fazer com o homem. Somente no final da tarde, o conteúdo de sua mochila, que ele foi forçado a esvaziar na alfândega, fez sentido.
Os agentes da alfândega, logicamente, receberam um telex informando-os sobre o atentado contra a vida de Hitler. O homem, Johann Georg Elser, foi transferido para Munique, onde de início, ficou em silêncio e, em seguida, negou qualquer envolvimento no incidente. Mas as evidências apontando para sua culpa tornavam-se cada vez mais claras. O que finalmente delatou Elser, que falava com um sotaque suábio, foram seus machucados, seus joelhos esfolados. O espaço vazio na coluna onde os explosivos foram escondidos só poderia ter sido atingido por alguém rastejando sobre os joelhos. Garçonetes também identificaram Elser como cliente assíduo da Bürgerbräukeller, e, então, ele acabou confessando.
Elser veio de um lugar modesto na região no sudoeste da Alemanha conhecido como Alpes Suábios. Ele era magro, porém forte, tinha um rosto simpático, gostava de tocar cítara e foi membro de uma associação histórica conservadora. Quando os alemães ainda podiam votar, Elser, que era carpinteiro, votava a favor do KPD (Partido Comunista Alemão), porque ele acreditava que os comunistas eram mais propensos a defender os interesses dos trabalhadores. Apesar de suas convicções políticas, o protestante Elser ia frequentemente à igreja aos domingos e orava regularmente. Ele se recusou a participar nas eleições fictícias do Terceiro Reich.
No final de 1920, um amigo convenceu Elser a ingressar na Frente Vermelha de Lutadores, uma organização militante que simpatizava com os comunistas. Mas Elser não era violento e nem um ideólogo obstinado. Em vez disso, ele era um músico muito talentoso, um homem muito apreciado pelas mulheres. Ele também era um homem que preferia a ação às palavras – Elser se tornou membro do Sindicato dos Marceneiros pela simples razão de que, "se deve ser membro desta união." Sempre que os discursos do Führer eram transmitidos no rádio, ele se retirava do lugar e também se recusava a cumprimentar seus colegas alemães com as palavras "Heil Hitler!"
Depois de confessar o crime em Munique, Elser foi levado para a sede da Agência de Segurança do Reich Alemão em Berlim, onde foi severamente torturado pela Gestapo. Mas o chefe das SS, Heinrich Himmler, mesmo depois das torturas, ficou insatisfeito com os resultados. Elser alegou ter agido sozinho, entretanto, Himmler não acreditava nessa possibilidade. Como poderia um desconhecido, um carpinteiro com uma educação singela, ter quase conseguido assassinar o Führer?
Para os nazistas, um envolvimento da inteligência britânica teria sido mais conveniente - Hitler já estava começando a alimentar a ideia de uma invasão da Inglaterra. Na verdade, dois agentes britânicos tinham acabado de ser presos e os nazistas rapidamente acusaram os dois homens como co-conspiradores de Elser. Mas o carpinteiro nunca tinha visto os dois britânicos. O homem que quase matou Hitler não era nem um intelectual, nem um agente que trabalhava para uma potência estrangeira. Elser, como ficou provado, não precisou estudar a política externa ou ser parte de algum corpo diplomático para perceber que a Alemanha e a Europa estavam se aproximando de uma catástrofe no final de 1930. Na época, ele confessou a um amigo que a Alemanha nunca teria um governo melhor, a menos que alguém viesse a derrubar o regime atual. Seu amigo incrédulo lhe respondeu que ele estava fora de sua razão, que ele nunca poderia executar tal proeza. A resposta de Elser foi que, mesmo parecendo impossível, ele tentaria, em seguida, acrescentou, no dialeto suábio: "Aber schwätzat net" - Não conte a ninguém!
No dia após o assassinato ter falhado, o porta-voz do partido nazista, o periódico Völkischer Beobachter, estampou a seguinte manchete em letras garrafais: "A Salvação Surpreendente do Führer", título que provavelmente refletia uma visão amplamente difundida entre a população alemã. A maioria dos alemães, mesmo aqueles que não eram nazistas, tinha decidido que Hitler - então um líder de guerra que colocara a Polônia de joelhos em apenas 21 dias - não era de todo ruim. Considerando que 6 milhões de alemães estavam desempregados em 1933, havia emprego para todos, apenas três anos mais tarde. A economia estava em pleno andamento, em parte como resultado dos programas de produção de armas de Hitler. Hitler proibiu os sindicatos, que poderiam ter criado exigências salariais inconvenientes para as empresas. Depois de anos de inflação e desemprego em massa, a Alemanha subitamente experimentava um boom econômico.
Mas o carpinteiro dos Alpes Suábios recusou-se a acreditar em uma única palavra de Hitler. Ele tinha um mau pressentimento e preocupava-se que Hitler planejava chamar o mundo para uma guerra horrível. Elser não confiava no ditador nazista, então, no verão de 1938, ele finalmente decidiu assassinar o "Führer". Nesse tempo, as suspeitas de Elser sobre Hitler tinham se tornado realidade: Em 21 de maio de 1938, Hitler deu a ordem secreta "para anexar o resto da Tchecoslováquia." Estadistas da Europa mais uma vez deixaram-se enganar pelo ditador alemão. Georg Elser, um simples carpinteiro, enxergara a verdade através do ardil nazista.
A Europa havia se transformado em um continente tenebroso em 1930. A luz da democracia vacilava, estando perigosamente perto de ser extinta. No momento em que Elser preparava seus detonadores, apenas 11, dos 28 estados europeus tinham constituições democráticas. As monarquias constitucionais da Europa da época, provaram ser mais resistentes aos totalitários, aos fascistas e às tendências de extrema direita. Mas os regimes autoritários e as ditaduras já tomavam conta da maioria dos países. É frequentemente esquecido que a democracia tem apenas algumas gerações de idade em muitos países europeus.
Tanto o Zeitgeist quanto o estado populista de Hitler, comemorado pela maioria dos alemães, se moviam em direções contrárias às crenças de Elser - e ainda assim ele nunca perdeu sua fé no valor da liberdade. Johann Georg Elser agiu como um cidadão consciente e de responsabilidade ética e política, sem o apoio de qualquer organização ou movimento, somente com o compromisso de uma lei fundamental não escrita. Na confissão, dada alguns dias após sua prisão, Elser reclamou que, entre outras coisas, a classe trabalhadora no estado nazista estava "sob uma certa compulsão." "O trabalhador, por exemplo, não pode mais mudar de emprego sempre que o desejar. E por causa daJuventude Hitlerista, ele não é mais o mestre de seus próprios filhos, e ele não é mais livre para adorar o que lhe agrada." Elser exigiu liberdade de movimento, liberdade de religião e liberdade de consciência - todos os direitos fundamentais que mais tarde seriam garantidos pela constituição alemã. Talvez à crítica do nacional-socialismo de Elser faltasse a condenação da agressão à Polônia, mas a mensagem era clara: a liderança do Partido Nazista estava a intervir na vida dos cidadãos de uma forma totalmente inaceitável, e os alemães deveriam lutar por seus direitos.
Depois que Elser foi assassinado no campo de concentração de Dachau, em abril de 1945, levou décadas para ele ganhar o respeito que merecia. Por volta de 1946, Elser foi até acusado de ter sido um agente da Gestapo. De acordo com uma teoria da conspiração, a qual até mesmo alguns historiadores do pós-guerra apoiaram, a tentativa de assassinato não passara de um truque da propaganda nazista.
Após essa teoria descabida, a morte de Elser foi simplesmente esquecida. Quem teria afinal, interesse em relembrar a história desse carpinteiro depois da guerra? Os alemães orientais não tinham nenhum uso para este solitário herói, cuja afinidade com o meio comunista foi limitada, na melhor das hipóteses. A liderança da Alemanha Oriental foi especialmente fria para com os individualistas, e na década de 1950, quando o SED empregou táticas brutais para lidar com centenas dos chamados "desviantes", até mesmo os comunistas poderiam rapidamente acabar na prisão por tomar posições individualistas. Mesmo quando o ex-presidente da Alemanha Oriental, Erich Honecker, afrouxou as rédeas por um curto período de tempo no início de 1970, Elser ficou impopular dentro da visão leninista da história. Johann Georg Elser, carpinteiro e herói de sua classe, foi ignorado na Alemanha Oriental durante o tempo em que os chamados trabalhadores e agricultores, supostamente detinham o poder do estado. Na verdade, mesmo quando Elser estava planejando seu ataque a Hitler, os comunistas provavelmente teriam tentado convencê-lo a desistir. Afinal de contas, o pacto Hitler-Stalin tinha acabado de ser assinado. No outono de 1939, a Alemanha e a União Soviética eram nações amigas.
A memória de Elser também foi de pouca utilidade no Ocidente por muitos anos. Os esquerdistas não sabiam bem como categorizar este individualista taciturno, e os conservadores viam Elser como um anão histórico incômodo, em comparação com outro pretenso assassino de Hitler: Claus von Stauffenberg. Logicamente, o fato de Elser ter origem humilde, desempenhou papel decisivo nessa avaliação.
Este esquecimento, tanto da esquerda como da direita foi, provavelmente, a maior injustiça infligida a Elser, após a sua morte. Hitler, nos 12 anos de seu reinado de terror, foi alvo de 42 tentativas de assassinato. Mas apenas dois homens, o conde Claus Schenk von Stauffenberg, um oficial militar, e Georg Elser, um carpinteiro, chegaram perto de matar o ditador alemão.
É por esta razão que a ação de Elser foi tão singular. O fato dele permanecer tanto tempo ignorado pelos historiadores alemães, serve apenas para mostrar o tempo que a Alemanha levou para honestamente confrontar-se com sua própria história. Johann Georg Elser é um verdadeiro herói alemão.
Os agentes da alfândega, logicamente, receberam um telex informando-os sobre o atentado contra a vida de Hitler. O homem, Johann Georg Elser, foi transferido para Munique, onde de início, ficou em silêncio e, em seguida, negou qualquer envolvimento no incidente. Mas as evidências apontando para sua culpa tornavam-se cada vez mais claras. O que finalmente delatou Elser, que falava com um sotaque suábio, foram seus machucados, seus joelhos esfolados. O espaço vazio na coluna onde os explosivos foram escondidos só poderia ter sido atingido por alguém rastejando sobre os joelhos. Garçonetes também identificaram Elser como cliente assíduo da Bürgerbräukeller, e, então, ele acabou confessando.
Elser veio de um lugar modesto na região no sudoeste da Alemanha conhecido como Alpes Suábios. Ele era magro, porém forte, tinha um rosto simpático, gostava de tocar cítara e foi membro de uma associação histórica conservadora. Quando os alemães ainda podiam votar, Elser, que era carpinteiro, votava a favor do KPD (Partido Comunista Alemão), porque ele acreditava que os comunistas eram mais propensos a defender os interesses dos trabalhadores. Apesar de suas convicções políticas, o protestante Elser ia frequentemente à igreja aos domingos e orava regularmente. Ele se recusou a participar nas eleições fictícias do Terceiro Reich.
No final de 1920, um amigo convenceu Elser a ingressar na Frente Vermelha de Lutadores, uma organização militante que simpatizava com os comunistas. Mas Elser não era violento e nem um ideólogo obstinado. Em vez disso, ele era um músico muito talentoso, um homem muito apreciado pelas mulheres. Ele também era um homem que preferia a ação às palavras – Elser se tornou membro do Sindicato dos Marceneiros pela simples razão de que, "se deve ser membro desta união." Sempre que os discursos do Führer eram transmitidos no rádio, ele se retirava do lugar e também se recusava a cumprimentar seus colegas alemães com as palavras "Heil Hitler!"
Depois de confessar o crime em Munique, Elser foi levado para a sede da Agência de Segurança do Reich Alemão em Berlim, onde foi severamente torturado pela Gestapo. Mas o chefe das SS, Heinrich Himmler, mesmo depois das torturas, ficou insatisfeito com os resultados. Elser alegou ter agido sozinho, entretanto, Himmler não acreditava nessa possibilidade. Como poderia um desconhecido, um carpinteiro com uma educação singela, ter quase conseguido assassinar o Führer?
Para os nazistas, um envolvimento da inteligência britânica teria sido mais conveniente - Hitler já estava começando a alimentar a ideia de uma invasão da Inglaterra. Na verdade, dois agentes britânicos tinham acabado de ser presos e os nazistas rapidamente acusaram os dois homens como co-conspiradores de Elser. Mas o carpinteiro nunca tinha visto os dois britânicos. O homem que quase matou Hitler não era nem um intelectual, nem um agente que trabalhava para uma potência estrangeira. Elser, como ficou provado, não precisou estudar a política externa ou ser parte de algum corpo diplomático para perceber que a Alemanha e a Europa estavam se aproximando de uma catástrofe no final de 1930. Na época, ele confessou a um amigo que a Alemanha nunca teria um governo melhor, a menos que alguém viesse a derrubar o regime atual. Seu amigo incrédulo lhe respondeu que ele estava fora de sua razão, que ele nunca poderia executar tal proeza. A resposta de Elser foi que, mesmo parecendo impossível, ele tentaria, em seguida, acrescentou, no dialeto suábio: "Aber schwätzat net" - Não conte a ninguém!
O Völkischer Beobachter, jornal porta-voz dos nazistas, tenta associar Elser com dois espiões britânicos.
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No dia após o assassinato ter falhado, o porta-voz do partido nazista, o periódico Völkischer Beobachter, estampou a seguinte manchete em letras garrafais: "A Salvação Surpreendente do Führer", título que provavelmente refletia uma visão amplamente difundida entre a população alemã. A maioria dos alemães, mesmo aqueles que não eram nazistas, tinha decidido que Hitler - então um líder de guerra que colocara a Polônia de joelhos em apenas 21 dias - não era de todo ruim. Considerando que 6 milhões de alemães estavam desempregados em 1933, havia emprego para todos, apenas três anos mais tarde. A economia estava em pleno andamento, em parte como resultado dos programas de produção de armas de Hitler. Hitler proibiu os sindicatos, que poderiam ter criado exigências salariais inconvenientes para as empresas. Depois de anos de inflação e desemprego em massa, a Alemanha subitamente experimentava um boom econômico.
Mas o carpinteiro dos Alpes Suábios recusou-se a acreditar em uma única palavra de Hitler. Ele tinha um mau pressentimento e preocupava-se que Hitler planejava chamar o mundo para uma guerra horrível. Elser não confiava no ditador nazista, então, no verão de 1938, ele finalmente decidiu assassinar o "Führer". Nesse tempo, as suspeitas de Elser sobre Hitler tinham se tornado realidade: Em 21 de maio de 1938, Hitler deu a ordem secreta "para anexar o resto da Tchecoslováquia." Estadistas da Europa mais uma vez deixaram-se enganar pelo ditador alemão. Georg Elser, um simples carpinteiro, enxergara a verdade através do ardil nazista.
A Europa havia se transformado em um continente tenebroso em 1930. A luz da democracia vacilava, estando perigosamente perto de ser extinta. No momento em que Elser preparava seus detonadores, apenas 11, dos 28 estados europeus tinham constituições democráticas. As monarquias constitucionais da Europa da época, provaram ser mais resistentes aos totalitários, aos fascistas e às tendências de extrema direita. Mas os regimes autoritários e as ditaduras já tomavam conta da maioria dos países. É frequentemente esquecido que a democracia tem apenas algumas gerações de idade em muitos países europeus.
Tanto o Zeitgeist quanto o estado populista de Hitler, comemorado pela maioria dos alemães, se moviam em direções contrárias às crenças de Elser - e ainda assim ele nunca perdeu sua fé no valor da liberdade. Johann Georg Elser agiu como um cidadão consciente e de responsabilidade ética e política, sem o apoio de qualquer organização ou movimento, somente com o compromisso de uma lei fundamental não escrita. Na confissão, dada alguns dias após sua prisão, Elser reclamou que, entre outras coisas, a classe trabalhadora no estado nazista estava "sob uma certa compulsão." "O trabalhador, por exemplo, não pode mais mudar de emprego sempre que o desejar. E por causa daJuventude Hitlerista, ele não é mais o mestre de seus próprios filhos, e ele não é mais livre para adorar o que lhe agrada." Elser exigiu liberdade de movimento, liberdade de religião e liberdade de consciência - todos os direitos fundamentais que mais tarde seriam garantidos pela constituição alemã. Talvez à crítica do nacional-socialismo de Elser faltasse a condenação da agressão à Polônia, mas a mensagem era clara: a liderança do Partido Nazista estava a intervir na vida dos cidadãos de uma forma totalmente inaceitável, e os alemães deveriam lutar por seus direitos.
Depois que Elser foi assassinado no campo de concentração de Dachau, em abril de 1945, levou décadas para ele ganhar o respeito que merecia. Por volta de 1946, Elser foi até acusado de ter sido um agente da Gestapo. De acordo com uma teoria da conspiração, a qual até mesmo alguns historiadores do pós-guerra apoiaram, a tentativa de assassinato não passara de um truque da propaganda nazista.
Após essa teoria descabida, a morte de Elser foi simplesmente esquecida. Quem teria afinal, interesse em relembrar a história desse carpinteiro depois da guerra? Os alemães orientais não tinham nenhum uso para este solitário herói, cuja afinidade com o meio comunista foi limitada, na melhor das hipóteses. A liderança da Alemanha Oriental foi especialmente fria para com os individualistas, e na década de 1950, quando o SED empregou táticas brutais para lidar com centenas dos chamados "desviantes", até mesmo os comunistas poderiam rapidamente acabar na prisão por tomar posições individualistas. Mesmo quando o ex-presidente da Alemanha Oriental, Erich Honecker, afrouxou as rédeas por um curto período de tempo no início de 1970, Elser ficou impopular dentro da visão leninista da história. Johann Georg Elser, carpinteiro e herói de sua classe, foi ignorado na Alemanha Oriental durante o tempo em que os chamados trabalhadores e agricultores, supostamente detinham o poder do estado. Na verdade, mesmo quando Elser estava planejando seu ataque a Hitler, os comunistas provavelmente teriam tentado convencê-lo a desistir. Afinal de contas, o pacto Hitler-Stalin tinha acabado de ser assinado. No outono de 1939, a Alemanha e a União Soviética eram nações amigas.
A memória de Elser também foi de pouca utilidade no Ocidente por muitos anos. Os esquerdistas não sabiam bem como categorizar este individualista taciturno, e os conservadores viam Elser como um anão histórico incômodo, em comparação com outro pretenso assassino de Hitler: Claus von Stauffenberg. Logicamente, o fato de Elser ter origem humilde, desempenhou papel decisivo nessa avaliação.
Este esquecimento, tanto da esquerda como da direita foi, provavelmente, a maior injustiça infligida a Elser, após a sua morte. Hitler, nos 12 anos de seu reinado de terror, foi alvo de 42 tentativas de assassinato. Mas apenas dois homens, o conde Claus Schenk von Stauffenberg, um oficial militar, e Georg Elser, um carpinteiro, chegaram perto de matar o ditador alemão.
É por esta razão que a ação de Elser foi tão singular. O fato dele permanecer tanto tempo ignorado pelos historiadores alemães, serve apenas para mostrar o tempo que a Alemanha levou para honestamente confrontar-se com sua própria história. Johann Georg Elser é um verdadeiro herói alemão.
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