Agostinho Lopes
Como idoso acho repugnante
Subscrevem a dita Opinião, para lá de cidadãos respeitáveis, de cuja boa fé não duvido, outros com responsabilidades directas e indirectas em todas as situações e problemas sofridos pelos idosos no contexto da pandemia. De facto, inaceitáveis.
Mas ver gente como Romano Prodi, Filipe González, Hans Gert Pöttering e outros, lamentar, choramingar pela situação dos «idosos» – arrepiados pelo «número dramático de mortes nos lares», «preocupados com as tristes histórias dos massacres de idosos nos lares» –, advogar a necessidade de «superar» a «institucionalização» e exigir a revisão dos «sistemas públicos de saúde», para impedir o surgimento de «um modelo perigoso que favorece um «serviço de saúde selectivo» que considera a vida do idoso como residual», e etc. (que as citações podiam continuar) – daria uma enorme vontade de rir se não fosse tão horrorosamente lamentável.
Não é que os responsáveis pelos baixos salários e pensões de reforma, colocando no limiar da pobreza e da sobrevivência milhões de habitantes da população europeia, e por políticas de urbanismo e habitação subordinadas à especulação imobiliária e financeira, impedindo que milhares de famílias tenham os rendimentos e a casa com meios e condições para albergar e cuidar dos seus ascendentes, «choram» pela «institucionalização»!?
Não é que os responsáveis por políticas sociais de orçamentos mínimos e que promoveram (e promovem) a privatização, tanto quanto possível, de funções sociais dos Estados a favor do capital privado e de instituições ligadas às cadeias de caridade assistencial das igrejas, ou seja, de lares que são na sua maior parte «armazéns de idosos» (por contraposição aos hotéis residenciais de idosos onde vivem os da minoria que têm grossos rendimentos ou patrimónios, reforçando na 3ª idade a já fortíssima desigualdade social existente na população activa), «choram» pelas coisas horríveis que aconteceram nos lares com a pandemia!?
Não é que os responsáveis pela mercantilização da saúde, pelas restrições financeiras dos serviços públicos de saúde, como o SNS, pela privatização realizada (e em curso) de áreas completas de serviços médicos e hospitalares – ver a ofensiva do grande capital em Portugal – «choram» pela adopção (inaceitável, ilegal e imoral) de critérios de valorização mercantil dos utentes e hierarquização correspondente no acesso aos tratamentos!? (Esqueceram-se de dizer que com os doentes ricos não terão dilemas morais nem necessidade de optar, porque haverá sempre um lugar num hospital privado... onde serão tratados).
Não é que os responsáveis pela troika que cá chegou e todas as outras troikas, os responsáveis pelos Pacto de Estabilidade, Pacto Orçamental, pelos Tratados de Maastricht e de Lisboa, pelo Euro e os seus dogmas monetaristas e neoliberais, pelos seus mandamentos do défice e da dívida pública, responsáveis pela desvalorização salarial, pelo congelamento das reformas, por políticas sociais anémicas e estrangulamento dos serviços públicos de saúde, acabam a chorar lágrimas de crocodilo pelos «velhinhos»!? É demais.
Idoso que sou, quero declarar repugnante, não a Opinião, mas a lata política de alguns dos que a assinam. Mas se insistirem em publicitá-la, juntem à subscrição, pelo menos, os nomes de Blair, de Merkel, de Delors e outros franceses e alemães e de outras nacionalidades... e, já agora, de uma lista imensa: Cavaco Silva, Guterres, Durão, Portas e sucessores
De foicebook
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